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Nas últimas quatro décadas, tem-se verificado a reestruturação dos modelos organizativos dos sistemas de transportes públicos nas áreas metropolitanas de muitas cidades europeias. Estas reestruturações têm sido motivadas com o objetivo de proporcionar uma gestão do financiamento com dinheiros públicos mais eficiente e eficaz, sem colocar em causa a qualidade do serviço público proporcionado aos utentes. Na implementação de modelos organizativos emergentes no sector do transporte público nas áreas metropolitanas de grandes centros urbanos, verifica-se uma preocupação crescente com a melhoria da qualidade do serviço público prestado, como forma de atração de mais utentes e desincentivo à utilização de transporte próprio, como forma de assegurar a sustentabilidade do sector a preços competitivos, aumentar a mobilidade dos cidadãos através da redução dos congestionamentos e redução dos impactos no meio ambiente. A adoção de novos modelos organizativos no sector dos transportes procura dar cumprimento às políticas definidas pela Comissão Europeia para este sector, refletidas no documento publicado em finais de novembro de 1995, com o título THE CITIZENS’ NETWORK – European Commission Green Paper.
No sector do serviço público de transportes podemos encontrar três tipos de sistemas com características diferenciadoras: sistemas regulados; sistemas de concorrência limitada; sistemas desregulamentados, também designados por sistemas de livre concorrência. Cada modelo assume características intrínsecas podendo observar-se uma intervenção direta ou indireta do estado. A título de exemplo, ao nível do serviço público de transportes, a oferta disponibilizada aos seus utentes pode ser condicionada, ou não, pela intervenção do Estado. Havendo uma intervenção estatal, ela poderá ser realizada de duas formas distintas: regulação direta ou mercado concorrencial através de tendering. Nesta última situação, as Autoridades Metropolitanas de Transportes serão responsáveis por selecionar a proposta com a melhor relação preço/qualidade para a execução do serviço de exploração apresentado pelos diferentes operadores, procurando contratualizar a proposta mais adequada ao serviço a prestar em determinada área urbana, rede ou linha, o que corresponde ao modelo que se encontra em fase de implementação na Área Metropolitana de Lisboa.
A adoção do modelo organizativo assente na iniciativa da Autoridade Metropolitana de Transportes implica a sua responsabilização pela prestação do serviço público de transportes num quadro legal de monopólio, em que a entrada de um qualquer operador de transportes resulta apenas da vontade da autoridade em solicitar a esse operador a realização de um determinado serviço.
A regulação do sector de transportes públicos assente numa estratégia de mercado de concorrência controlada assume-se como a forma de regulação que melhor combina o trinómio eficiência económica, qualidade do serviço prestado e o incentivo à utilização do transporte público. Todavia, é fundamental que os benefícios económicos sejam encarados numa perspetiva de longo prazo, evitando-se que um operador selecionado para prestar determinado serviço assuma uma posição de monopólio privado. Impõe-se a existência de uma pressão constante sobre os custos, não permitindo que se retire ao mercado a experiência técnica do controlo público.
Existem vários exemplos de sucesso no sector dos transportes em grandes áreas urbanas, da passagem de mercados fechados para mercados de concorrência controlada, sendo exemplo disso, a transição efetuada no serviço de transportes públicos da cidade de Estocolmo. Em 1990, 70% dos custos operacionais inerentes à prestação do serviço público de transportes era suportado através de financiamento público. Em 2002, os subsídios públicos já representavam apenas 50% dos custos operacionais. Esta redução da comparticipação com fundos públicos foi conseguida simultaneamente com um aumento dos níveis de qualidade do serviço prestado.
Esta estrutura de modelo organizativo para as Autoridades Metropolitanas de Transportes tendencialmente deverá induzir um processo prévio de certificação dos operadores rodoviários que podem operar em determinada área geográfica. Assim, só operadores certificados/licenciados poderão ser opositores em concursos públicos lançados para assegurar determinado serviço, potenciando-se elevados padrões de qualidade do serviço prestado a custos controlados. Por outro lado, na concessão de serviços, o operador suporta o risco inerente à montagem da estrutura necessária para prestar o serviço e à respetiva operação. As concessões caracterizam-se pela transferência da responsabilidade operativa, sendo o operador remunerado pelo utente do serviço através do pagamento de uma tarifa considerada justa. Pretende-se assim estimular a prestação de um serviço eficiente atingindo objetivos definidos pela Autoridade.
Por outro lado, as especificidades de determinada área geográfica podem impor uma estrutura diferente ao modelo organizativo assente em mercados de concorrência limitada, encarando o licenciamento como uma forma de concorrência direta, em conjugação com os conceitos de concessão e autorização. Neste contexto, o licenciamento constitui apenas uma certificação de determinado operador de transportes para entrar no mercado, em função de um conjunto de requisitos pré-definidos, tais como a sua reputação, dimensão da frota, qualidade e diversidade da mesma, situação financeira, competência profissional, etc.
João Calado
(Professor Coordenador c/ Agregação do ISEL)
(ex-Vereador do PSD)