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O meio ambiente envolve todas as coisas vivas e não vivas que existem na Terra, que afetam os ecossistemas e a vida dos seres humanos. Na Conferência de Estocolmo, organizada pelas Nações Unidas em 1972, foi abordada a temática relativa à relação da sociedade com o meio ambiente, constituindo-se assim como a primeira atitude mundial reveladora de preocupações de preservação do meio ambiente, o qual foi definido como sendo “o conjunto de componentes físicos, químicos, biológicos e sociais capazes de causar efeitos diretos ou indiretos, em um prazo curto ou longo, sobre os seres vivos e as atividades humanas”.
Na genealogia das questões ambientais germinam três vertentes dominantes que, por sua vez, marcaram a génese das diferentes tradições ambientais: a velha questão conservacionista/natureza selvagem sempre presente mas nunca muito incisiva; a fome/demografia; e a bomba atómica/nuclear – as quais, nos anos 70, deram origem ao “ambientalismo moderno”.
Portugal não tem verdadeiramente inscrito no “código genético” da sua política ambiental moderna, nenhuma das raízes do ambientalismo internacional. Quando muito, vislumbra-se uma raiz conservacionista sobretudo devido aos trabalhos da Liga para a Proteção da Natureza (LPN). A LPN, fundada em 1948 e que se enquadrava de facto nos movimentos conservacionistas internacionais da época, produziria inúmeras pesquisas, bem como os primeiros inventários do património natural que iriam estar na origem de muitas das atuais áreas protegidas. Manteve, no entanto, um perfil muito discreto ao nível da sua intervenção política e pública, tendo nas suas três primeiras décadas de existência, uma tarefa quase estritamente científica e académica.
As questões ambientais entre nós tiveram, assim, um percurso muito próprio. O país chegou à política ambiental, ou melhor dizendo, a política ambiental chegou ao país, marcada sobretudo pela influência externa, primeiro de efemérides, e depois através das leis e diretivas europeias. Todavia, apesar do momento crucial ser o da adesão à UE, já antes é possível identificar factos e momentos em que se verificou o dito impulso externo, embora apenas a partir da Primavera Marcelista. Nessa altura, o Ano Europeu da Conservação da Natureza, em 1970, desencadeou a primeira Legislação da Conservação da Natureza (Lei 7/70). Por outro lado, foi a necessidade de preparação da participação portuguesa na Conferência de Estocolmo que esteve na origem da Comissão Nacional do Ambiente. Esta, criada em 1971 no âmbito da Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, produziu em 1971 o primeiro “Relatório Nacional sobre os Problemas Relativos ao Ambiente”, em Portugal.
Passado o período da revolução com as suas especificidades próprias, entre as quais, a desvalorização das questões relacionadas com política ambiental, foi de facto a adesão à União Europeia (1986), quase coincidente com o Ano Europeu do Ambiente (1987), que constituiu um marco crucial na política ambiental do país, trazendo-lhe novas exigências, reforçando-lhe a legislação e intensificando as medidas. A UE trouxe ainda claras vantagens de apoio financeiro para infraestruturas básicas e consequente melhoria das condições de vida.
Efetivamente, os finais dos anos 80 foram anos charneira em que se conjugaram alguns fatores e acontecimentos chave para o protagonismo das questões ambientais. Ao nível legislativo, destaca-se a aprovação da Lei de Bases do Ambiente em 1987. Na sua sequência surgiram leis sobre os mais diversos problemas ambientais: gestão da poluição da água, do ar e do ruído e dos resíduos, defesa do litoral e proteção das espécies. Entre 1987 e 1992 foram publicados quase 70 diplomas implicando diretamente a gestão dos recursos naturais e a proteção do ambiente.
Contudo, toda esta parafernália de leis e diretivas comunitárias transpostas para a legislação portuguesa produziu poucos resultados efetivos face às expectativas criadas. Quando, mais tarde, os sucessivos diagnósticos foram avaliando o impacto das políticas, leis e medidas que nos vieram de fora, verificou-se que esta influência externa acabou por ter frágeis reflexos internos. Por exemplo, ao nível do saneamento básico, efetuados cerca de 4 mil milhões de euros de investimento nos três Quadros Comunitários de Apoio, entre 1986 e 2006, em esgotos e em Estações de Tratamento de Águas Residuais, o resultado do levantamento do estado dos rios feito em 2000 mostrava como 70% dos cursos de água estavam ainda gravemente poluídos (ainda hoje um número significativo o está).
Outro exemplo é o caso dos Resíduos Industriais Perigosos (RIP), desde 1985, aquando da primeira legislação, fizeram-se cinco diagnósticos diferentes sobre a situação dos lixos, elaboraram-se cinco planos distintos e propuseram-se várias soluções técnicas opostas entre si. O resultado é que, após mais de 35 anos, a política dos RIP começa agora a resolver-se.
O insucesso destes casos à escala nacional só se consegue compreender considerando as limitações e dificuldades nos pressupostos que implicam uma política ambiental consistente. Considerados os 3 eixos fundamentais que compõem uma Política Ambiental – eixo internacional, eixo cívico e eixo oficial – verificamos que, se Portugal adquiriu dimensão internacional/global por via da adesão à União Europeia, ainda está longe de conseguir uma dimensão cívica forte e uma estrutura administrativa oficial com autonomia e capacidade de afirmação.
João Calado
(Professor Coordenador c/ Agregação do ISEL)
(ex-Vereador do PSD)