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A prestação do serviço educativo de nível superior é assegurada pelas instituições públicas e privadas do ensino superior e consubstanciada nas atividades de investigação, desenvolvimento e inovação que desenvolvem, na formação que ministram e nos serviços que prestam à comunidade envolvente. Efetivamente, estas instituições têm por missão a criação e transmissão do conhecimento científico, tecnológico e artístico, em conformidade com o estado-da-arte, o qual assume um papel determinante na adoção de boas práticas intrínsecas ao exercício das mais diversas atividades profissionais, com impactos relevantes na melhoria da qualidade de vida das pessoas e no desenvolvimento económico do país.
No que se refere às instituições de ensino superior públicas, financiadas maioritariamente com dinheiros públicos, será expectável um desempenho eficiente e eficaz que, para além de assegurar a formação dos seus diplomados com elevada qualidade, assegure a transferência de conhecimento e tecnologia para as empresas, alavancando processos de inovação determinantes para a melhoria da sua competitividade no mercado nacional e nos mercados internacionais.
A organização da atual rede de instituições de ensino superior do país, regulada pelo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), aprovado pela Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, encontra-se estruturada com base num modelo binário, sem que exista fundamentação clara, objetiva e transparente, que justifique a adoção do modelo em apreço.
Os defensores do modelo binário sustentam frequentemente a sua argumentação com base no binómio “saber/saber fazer”. Todavia, após ter decorrido mais de um século sobre a revolução industrial, fará sentido continuar a persistir numa visão Taylorista que, no que se refere às instituições de ensino superior, se encontra consubstanciada na Lei de Bases do Sistema Educativo e no RJIES?
De facto, se quisermos ser intelectualmente rigorosos, o binómio mencionado no parágrafo anterior é apenas representativo de duas vertentes intrinsecamente relacionadas com a existência e criação de conhecimento, sendo desejável que ambas se conjuguem para a promoção da inovação tecnológica, cultural e artística. É neste contexto que, no âmbito das atividades realizadas nas instituições de ensino superior, as atividades letivas não podem, nem devem, estar dissociadas das atividades de investigação e desenvolvimento realizadas, e ambas devem estar alinhadas com as necessidades e expetativas da sociedade. As atividades de investigação, desenvolvimento e inovação são atualmente assumidas como um fator diferenciador das instituições de ensino superior, sendo os correspondentes resultados utilizados para aferir a qualidade do seu desempenho, mas acima de tudo são determinantes para o desenvolvimento das instituições, permitindo o cumprimento global da sua missão, nomeadamente no que se refere à transferência para a sociedade de conhecimento científico, tecnológico e artístico que, inevitavelmente, se traduzirá em desenvolvimento económico e social do país.
Por outro lado, a rede de instituições de ensino superior atualmente existente no país é consequência de um conjunto de constrangimentos e oportunidades que caraterizaram um passado ainda recente, nomeadamente resultantes da incapacidade de as instituições existentes no fim da década de 70, início da década de 80, darem resposta à pretendida massificação da frequência do ensino superior, dando origem ao aparecimento de um conjunto de novas instituições disseminadas pelo país. Embora a expansão da rede de instituições de ensino superior e da oferta formativa por elas proporcionada não tenha sido convenientemente articulada com a existente, a relevância da intervenção destas instituições no desenvolvimento das comunidades em que se inserem não é negligenciável. Todavia, este desiderato não significa que atualmente tenhamos um desempenho eficiente e eficaz da generalidade das instituições de ensino superior existentes no país.
É neste contexto que urge criar as condições legislativas e regulamentares que proporcionem um tratamento idêntico às instituições de ensino superior, independentemente do subsistema em que se inserem, universitário ou politécnico, rentabilizando os recursos humanos e materiais nelas existentes. O modelo organizativo atualmente existente induz um tratamento diferenciado das instituições em função do subsistema em que estão inseridas, criando dificuldades artificiais ao cumprimento da sua missão, com graves prejuízos para o país, nomeadamente no que se refere às instituições financiadas maioritariamente com dinheiros públicos. Exige-se que sejam definidos critérios de qualidade para a avaliação do desempenho e da capacidade instalada nas instituições de ensino superior, aplicáveis de igual forma a todas elas independentemente do subsistema em que se inserem, proporcionadores de igualdade de oportunidades para ministrar os três ciclos de formação consagrados para o ensino superior, licenciatura, mestrado e doutoramento.
Um país com a dimensão de Portugal não pode continuar a senda do desperdício de recursos financiados com dinheiros públicos, tratando de forma diferente o que é igual e em algumas situações melhor, apenas porque na conjuntura da expansão da rede de instituições de ensino superior do país, uma ficou inserida num subsistema e outra noutro. Exige-se que sejam criadas as condições legislativas e regulamentares que proporcionem igualdade de oportunidades no acesso a financiamento de projetos de investigação, desenvolvimento e inovação, potenciadoras da maximização do contributo de todas as instituições de ensino superior, independentemente do subsistema em que se inserem, para o desenvolvimento económico, social e cultural do país. Este desiderato só será alcançável, quando forem aplicados os mesmos critérios de qualidade para aferir a capacidade das instituições para ministrarem os três ciclos de estudo consagrados para o ensino superior, independentemente de estarem inseridas no subsistema politécnico ou universitário.
João Calado
(Professor Coordenador Principal do ISEL)(ex-Vereador do PSD)