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Fui, sou e serei sempre um apologista das Regiões Administrativas. Tenho vindo a contribuir, de diversas formas, e por diversos meios seja na saudosa Odivelas TV, em 2011, onde tive o privilégio de participar https://www.youtube.com/watch?v=f8fGeAnvJ_M, e https://www.youtube.com/watch?v=Ab8eTWT_jg8 num debate sobre o tema, quer mais recentemente no LouresTv, https://www.youtube.com/watch?v=jsJYG4vMKsE noutro debate sobre a mesma matéria, (https://noticiaslx.pt/2022/04/16/regioes-administrativas-vs-regionalizacao/ ) pelo que sinto nada mais ter a acrescentar em abono da mesma, para além de dezenas de artigos de opinião, e até uma obra, tese de licenciatura, que publiquei na Madeira sob o título “O Municipalismo em Portugal, Brasil e Cabo Verde”. Isto reflecte bem o meu contributo cidadão, numa matéria crucial para Portugal.
Sendo um observador atento à dinâmica político-partidária, escorada em mais de 3 décadas de militância, iniciada, formalmente, em 1985, na secção dos portuários, Lisboa, tenho uma perspectiva muito fina, com filtros de várias matizes, que me levam à conclusão em título.
Se, como diz o poeta espanhol António Machado – “o caminho faz-se caminhando”, (se hace camino al andar), para as Regiões Administrativas já não há caminho nenhum, senão um jogo de sombras a fazer de conta que se caminha para algum lado, um pouco a lembrar a “Alice” no “País das Maravilhas”, quando pergunta ao gato Cheschire que caminho haveria de tomar, indagando ele qual o destino pretendido por ela, ao que Alice respondeu não saber para onde ir, sentenciando o gato “então qualquer caminho serve para ti”.
E foi nisto que o tema Regiões Administrativas redundou, um “país das maravilhas” que não sabe para onde quer ir, então qualquer caminho serve.
Será assim? Vamos ver … .
Em 1976, a constituição da República Portuguesa estruturava o poder local em 3 entidades territoriais: Regiões Administrativas, Municípios e Freguesias. O simbolismo deste ternário é enorme, e realce-se, nos mistérios exotéricos, simboliza a idade da aprendizagem, o que encaixa com a necessidade de se iniciar do zero o poder Local democrático à época.
Nem todos os partidos simpatizavam com esta matriz do Poder Local, uns porque temiam enfraquecer o Poder Central, numa altura critica para o País, acabado de se emancipar, dos grilhões da ditadura, outros porque temiam puderem virem a ser as Regiões Administrativas, mais um patamar de poder ao alcance de partidos que não lograssem alcançar o poder central.
O primeiro revés para as Regiões Administrativas foi a solução de compromisso, conhecida por ter “um pé dentro e outro fora”, e passou por ficar plasmada na constituição, mas não ser de aplicação imediata, priorizando-se, antes, as freguesias e os municípios. Um erro como se vê 47 anos depois. O centralismo continua.
Em 1997, o líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, que se entretinha a inventar noticias para Paulo Portas publicar no “Independente”, (ficando célebre a sobremesa “vichissoise” que ninguém comeu, num dado jantar, mas com honras de primeira página, para gáudio do professor-inventor da peta) lá teve a graça e engenho de convencer o actual secretário geral da ONU, António Guterres, então secretário geral do PS, a “empatar” as Regiões Administrativas, pontapeando-a para um referendo, sabendo Marcelo, que a melhor forma de obstaculizar algo é sujeitá-la a referendo.
Lembro-me bem, nessa época, Guterres declarar, no comício do PS da rentrée de então, realizado na Pontinha, em Faro, enquanto decorria o do Pontal, também em Faro, do PSD, que era o único primeiro ministro do mundo que queria perder poder, na medida em que a criação das Regiões Administrativas se fariam á custa de poderes a transferir da administração central para as Regiões. Eu estava lá, e ingenuamente acreditei que as regiões administrativas seriam uma realidade … . Enganei-me.
Como se esperava, o referendo chumbou as Regiões Administrativas, corolário de um monumental processo comunicacional de desinformação e medos, moldando o povo, cuja cruz, no boletim de voto, teve o significado de cruz de uma morte flagelada, curiosamente, o apóstolo André ao ser crucificado pediu para o ser numa cruz deitada (X), por não se sentir digno de morrer numa cruz igual á de Jesus. Temos, pois, simbolicamente as Regiões Administrativas flagelada pela cruz do “não”.
Mas o douto inventor da “vichissoise”, para ter a certeza que o assunto ficaria devidamente agrilhoado, nas masmorras constitucionais, lá conseguiu que na revisão constitucional, se condiciona-se a Região Administrativa, a um referendo, em condições tais, que praticamente será improvável alguma vez vir a ter ganho de causa.
Marcelo, filho de um governante da ditadura fascista, talvez influenciado pelas virtudes do centralismo, levou a água ao seu moinho.
De então para cá, nada de novo, o CDS é contra como foi contra a constituição de 1976 … está tudo dito. O PCP é o único declaradamente a favor. Os demais vão inscrevendo nos seus programas eleitorais, tímidas pretensões a avançar com o tema, outros vão dizendo não ser a altura adequada, de resto em 47 anos nunca foi, para eles, a altura adequada, outros ainda são “nins”, e propalam a ideia de que é preciso fazer uma avaliação da descentralização, que tem vindo a ser feita (e já aqui expliquei que isso é uma falácia), outros ainda vão com os da feira e regressam com os do mercado. É tudo a fingir, porque no fundo não há vontade politica nenhuma de avançar com as Regiões Administrativas.
Marcelo, agora Presidente da República, em Dezembro de 2021 apontou 2024 como o ano em que se fará uma consulta popular sobre as Regiões Administrativas … tempo perdido. Até pode vir a acontecer o referendo, mas também é certo que a desinformação, o boato e a mentira sairão vencedores desse referendo, e a abstenção será bem superior ao “sim” e até ao “não”.
Portugal fica, mais uma vez, adiado.
Oliveira Dias
Politólogo