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Há muito que no Bairro do Jardim da Amoreira, na Ramada, se clama pela instalação de abrigos juntos das paragens de autocarros.
Esta semana, surgiram em algumas paragens (só nas que correspondem ao trânsito no sentido de Odivelas), uns ditos Avisos como o da imagem abaixo.
Quem estas coisas viu ficou com a certeza que qualquer um pode intervir na via pública, pois nestes quase-Avisos, tão-pouco se identificava o executante como o dono da obra. Aliás, só se começou a perceber o que ali estava a querer ser feito graças ao contacto estabelecido com os trabalhadores da empresa que está a executar a obra.
Pelo caminho, verificou-se que as instalações destes abrigos de paragens estavam a ser feitaos às custas da redução de dois lugares de estacionamento por paragem.
De novo a população daquele Bairro foi ignorada pelo Grande-Irmão que tudo decide num deplorável e persistente exercício antagónico ao princípio democrático da participação popular, consubstanciado na audição dos interessados.
Em tudo, este processo faz recordar outro bem recente, o da recolha dos bio-resíduos, em que a tutela local colocou em prática o mesmo princípio assente na premissa de que “eu é que sei”. (https://noticiaslx.pt/2023/01/01/separacao-insalubre-dos-bio-residuos-externalizacao-gratuita-de-obrigacoes-nao-obrigado/)
Há muito que digo que não há democracia sem democratas, sendo que além do crescimento de organizações políticas de matriz autocrática denoto que quem a elas deveria confrontar, tem feito precisamente o mesmo que estas advogam.
Desde os pequenos dossiers, que são estes que enformam as nossas vidas, aos dossiers estruturantes impostos por uma elite amiúde desconhecedora das nossas necessidades e sem quaisquer motivações para ir ao encontro de quem a elege, estamos bem servidos.
Pior, na presença disto permitimos que a democracia se tenha reduzido ao fraco poder de voto de alguns, transformando-a num exercício cíclico de desresponsabilização e até alienação, longe das devidas exigências de cidadania e ainda mais longe da intervenção capaz de exigir dos actores políticos performances assentes em pergaminhos de verdadeiro Serviço Público, i.e., servir.
A quem teve esta brilhante ideia:
- Teria sido bom ouvir as populações;
- Teria sido bom que a Câmara Municipal de Odivelas, dona desta obra, não se escondesse atrás destes sabujos “Avisos”;
- Teria sido bom entender que os serviços públicos existem para servir e tal passa por considerar as opiniões de quem servem, mas tal tem de ser precedido da audição destes. Certamente, que naquele bairro haveria quem pudesse sugerir opções não tão castradoras dos lugares de estacionamento;
- Teria sido bom pensar em servir.
Tão deficitária está a nossa democracia que em fóruns de debate que proliferam assiste-se à ausência da diversidade política, todavia desengane-se quem pensa que os extremistas não vão lá. Não, eles são chamados a ir e vão aproveitando também esses espaços para destilar os seus ódios de estimação.
Recentemente participei num desses debates. O tema, que me é mui querido, por motivos bem diversos dos da maioria, visava a pertinência da existência de um serviço militar obrigatório. Pois, sem prejuízo das diversas opiniões que existem sobre esta questão, verifiquei que, até aqui, o discurso xenófobo, inaceitável e inconcebível ser produzido por democratas saiu a terreiro. É lamentável, que os democratas não exerçam o seu direito, mas acima de tudo o seu dever de intervenção e permitam que tempos de antena que deveriam assentar nos pilares da urbanidade e dos mais altos valores da civilização e da razão, sejam substituídos pela barbárie, que volvida um século está de novo a fazer o mesmo caminho para se impor e impor-nos formulações societárias autocráticas.
Lamento as vãs tentativas recentes dessa milícia política que procuraram instrumentalizar sindicatos na sua agenda política, procurando imiscuir-se como fizeram os seus antepassados políticos na acção sindical chegando mesmo a pretender a construção de mais uma Central Sindical, claro, sob o seu jugo e controlo.
Lamento que em presença destes exercícios, aqueles que estão no Poder não percebam que têm de juntar esforços, servindo melhor.
Lamento que aqueles que aspiram ao Poder não se demarquem claramente destes, que através dos medos, dos ódios e da mesquinhez pretendem o regresso ao Antigo Regime, onde muitos dos direitos de que hoje dispomos, se exercidos dão ordem de prisão e até de morte.
Saibamos, pois, combater o déficit democrático com a mesma intensidade dos déficites económicos e financeiros!
Paulo Bernardo e Sousa, Politólogo