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Muitas vezes vemos vozes abalizadas, no espectro politico, mas também no espectro económico, clamar contra aquilo que consideram a falta de uma “visão” nacional, de um desígnio para o País, por parte da generalidade dos governos desde 1974, até ao presente, tirando, talvez, hodiernamente, a rara excepção que a adesão à CEE proporcionou, a qual correspondeu a uma opção nacional entre o atlantismo (Estados Unidos da América) ou o Europeísmo (CEE), nas palavras de Mário Soares, nos idos do inicio da década de oitenta do século passado. Vingou, como sabemos, em 1986 a adesão ao espaço politico europeu.
Nunca tive qualquer dúvida, do Mar oceano se constituir, desde a génese da nossa nação, como um desígnio nacional, ontem, cujo ponto alto foram os descobrimentos, com tudo o que isso implicou, hoje, com a actual rede de portos marítimos e suas potencialidades, em especial Sines, mas não só, e no futuro, com a consolidação da expansão da plataforma continental, cuja confirmação, ou homologação, por parte das Nações Unidas, escorados na reclamação desse espaço formalizado junto daquele organismo, em maio de 2009, dará a Portugal, uma das maiores extensões marítimas exclusivas, e águas territoriais ampliando até 4 milhões Km quadrados, a dimensão do nosso País.
Estima-se que a biodiversidade, os minerais raros e outras potencialidades derivadas dos solos marítimos e das respectivas águas territoriais, constituíram um manancial riquíssimo em recursos para o País.
Quando se fala no “cluster” marítimo, vem-nos á cabeça de imediato, para quem privou profissionalmente com portos marítimos, como é o meu caso, de uma diversidade de “actores”, os quais no seu conjunto muito contribuíram para a oneração das taxas portuárias, praticadas no passado, e também no presente, tornando pouco atractivo a atracagem de navios mercantes em Portugal, sejam eles: Os armadores marítimos; Agentes de navegação; Companhias de navegação; Transitários; Operadores portuários (tráfego, estiva e conferentes); Alfandega; Administração dos Portos (em Lisboa a AGPL); Policia Marítima; Brigada fiscal da GNR (antigamente era a Guarda Fiscal); Centro coordenador de tráfego portuário; Operadores portuários de desconsolidação de contentores; Os rebocadores de navios (um navio não navega livremente adentro da barra); Piloto de barra (dentro da barra, não é o comandante do navio quem comanda mas sim o piloto que se desloca ao navio para o comandar em rota segura até á atracagem); e por fim os Sindicatos portuários, os quais, no passado, impunham regras draconianas aos operadores portuários, em matéria de contingentes e constituição de equipas, por exemplo a operação de um empilhador de 40 toneladas, requeria, obviamente, um manobrador (nome de quem operava o empilhador), sendo quanto baste para uma normal operação, os sindicatos impunham mais 3 manobradores a recrutar casuisticamente na “casa do Conto”, nome por que era conhecido o centro coordenador de trabalho portuário, organismo criado para absorver todos os tarefeiros á jorna (ao dia), que acorriam ao porto de Lisboa, para angariar trabalho, integrando, após a criação do organismo, membros do quadro permanente. Tudo custos de actividade … .
Num passado não muito distante Portugal orgulhava-se de ter tido 3 ou 4 grandes armadores nacionais, tendo sido o primeiro criado em 1871 – a Empresa Insulana de Navegação (EIN), cujo logotipo é o primeiro encimando este texto, tendo por principal actividade a exploração das ligações marítimas entre Portugal continental e as ilhas da Madeira e dos Açores, tendo tido um total de 13 embarcações mercantes, incluindo o paquete Funchal.
A Companhia Nacional de Navegação (CNN), segundo logotipo, criada em 1881, visando a exploração das rotas marítimas com as colónias, chegou a possuir uma frota mercante de 21 embarcações.
A Companhia Colonial de Navegação (CCN), terceiro logotipo, foi criada em 1922, retirando o monopólio à CNN, da exploração das ligações marítimas ao ultramar. Chegou a possuir uma frota de 46 embarcações, 7 das quais paquetes (nome por que eram na época conhecidos os navios de cruzeiro).
A Companhia de Transportes Marítimos (CTM), foi criada em Fevereiro de1974, pela fusão da CNN com a CCN.
A marinha mercante, entre navios de carga a granel e contentorizada, até à década de oitenta do século passado, teve uma frota, no seu conjunto, ao longo das respectivas existências dos seus armadores, um cúmulo de 80 navios, incluindo cerca de 8 paquetes famosos.
Se a isto somarmos os 38 navios tanques da SOPONATA, armador específico para transporte de combustível fóssil e outros líquidos, chegamos à fasquia dos 118 navios portugueses da marinha mercante.
Após 1974, e a descolonização, perderam-se irremediavelmente a exploração marítima das rotas com os territórios coloniais, agora países independentes, a que se juntou outro factor, autêntico cadafalso, para a marinha mercante portuguesa de paquetes – o transporte aéreo, mais rápido, mais barato e até mais seguro.
Mesmo considerando, actualmente, a dependência do País em cerca de 80% das suas exportações, aqui chegarem por via marítima, a marinha mercante portuguesa simplesmente extinguiu-se. As taxas dos nossos portos são incomparavelmente superiores a dos demais portos europeus, mesmo sendo mais distantes. Por exemplo para um navio mercante oriundo dos Estados Unidos para a Europa, o porto mais próximo no continente europeu são os portugueses, porém, fica-lhes bem mais barato, aportarem ao porto espanhol de Algeciras, e daí o contentor seguir, via rodoviária, para o resto da Europa.
Hoje todos sabemos e acompanhamos os esforços do País para manter a TAP, uma companhia aérea, da maior importância para o País, nela injectando muitos milhares de milhões de euros.
Imagine-se se semelhante importância se desse ao sector marítimo … .
Os transportes, quaisquer que sejam, são vitais para qualquer País, os ferroviários, cuja adaptação ás bitolas europeias acarretaram e ainda acarretam vultuosos investimentos, os rodoviários, que beneficiaram da priorização de fundos europeus para a excelente rede viária que temos, mas cuja pegada ambiental a torna desinteressante para o transporte internacional, e a marítima, esta a exigir investimentos de composição de frota adequada, com forte aposta no transporte contentorizado.
De resto o contentor (existem apenas duas tipologias o de 20 toneladas e do de 40 toneladas) está para o transporte de mercadorias, como o jerrican está para o combustível – revolucionou a sua utilização, pelos ganhos de eficácia imediata.
Portugal com a sua posição geográfica impar no contexto das grandes rotas marítimas, está dotado dos seguintes portos:
- Viana do castelo;
- Leixões;
- Aveiro;
- Figueira da Foz;
- Lisboa;
- Setúbal;
- Sines;
- Madeira;
- Açores
A economia do mar, dinamiza um sem fim de serviços e indústrias, quer internamente, quer externamente, sendo que ao nível internacional a concorrência é fortíssima. Mas o Know how, está cá, é como que um ADN permanente.
Este cluster marítimo não é compaginável com a inexistência de um ministério do mar. Ao longo da história do Portugal democrático, nem sempre os governos incluíram um ministério do mar, algo incompreensível face á centralidade que o mar tem na vida do País.
O actual governo tem o ministério da economia e do mar, isso é bom, porém, melhor seria se o mar tivesse um ministério próprio, porque com especificidades próprias, a merecerem um foco mais apurado.
A tudo isto se junta o desiderato da expansão da plataforma continental, algo que leva a soberania portuguesa muito além da Zona Económica Exclusiva (ZEE), composta pelas 200 milhas náuticas, isto é, só se aplica á água, ao passo que a plataforma continental aplica-se ao solo e sub-solo que se espraia para além da praias oceânicos atlânticos de Portugal, e englobam todas as ilhas (dos Açores e Madeira).
Ainda não houve fumo branco da parte da ONU à pretensão portuguesa, mas o dossier está de tal forma técnica e cientificamente tão bem estruturado, segundo os peritos da ONU, que é uma questão de tempo até termos o aval definitivo.
Até lá, temos muito a fazer, preparar o País para essa enorme responsabilidade, e não só ao nível da estrutura e logística visando a manutenção da soberania portuguesa, o que implica reforçar a marinha de guerra portuguesa com meios qualitativos e quantitativos, de que destaco por exemplo, a valência submarina, para garantir o ius impérie, de Portugal, mas capacitando a sociedade civil, desde a marinha mercante, que urge, fazer renascer, qual fénix, às universidades, depositárias de saberes da melhor qualidade, reconhecida internacionalmente, graças aos nosso melhores embaixadores (académicos e investigadores se cientistas), para extrairmos desse “novo” território, o manancial que tem para proveito do País e dos portugueses, claro sem exaurir os recursos.
Concomitantemente, impõe-se estarmos alerta para investidas externas, mormente dos nossos vizinhos espanhóis, para quem as ilhas selvagens são alvo de apetite, por estarem mais perto das canárias do que da Madeira, pese embora se incluírem no arquipélago da Madeira. Para so espanhóis as selvagens são um conjunto de três rochedos no meio do mar, que lhes pertencem. Para os Portugueses são três pequenas ilhas que nos pertencem.
A nosso favor joga o Direito Internacional marítimo que reconhece as selvagens como ilhas ou ilhotas. Se fossem rochedos não seriam passiveis de reclamação.
Caso os espanhóis tivessem ganho de causa, o que nunca aconteceu, a pretensão da extensão da plataforma continental portuguesa saíria seriamente afectada e reduzida.
Portugal tem procurado assegurar a sua soberania sobre as Selvagens, seja com a manutenção permanente de vigias da natureza, seja por esporadicamente ali destacar um grupo de fuzileiros, como chegou a acontece rem 2006, para dissuadir os afoitos pescadores espanhóis que insistiam a ali fazer a sua faina comos e de território canarinho se tratasse.
Quase todos os Presidentes da República ali se deslocaram, tendo Mário Soares inaugurado essa tradição, falto o actual Presidente fazê-lo também, quem sabe no intervalo das suas constantes viagens ao estrangeiro. Jaime Gama, quando presidiu á Assembleia da República também o fez, tendo sido, creio o único Presidente da Assembleia da República a fazê-lo.
Mas, sendo uma parte do território nacional tão remota, justificava-se uma presença militar e não só mais intensiva e permanente. O interesse nacional reclama-o, quanto mais não seja, porque aquelas ilhas fazem parte dos argumentos territoriais da plataforma continental.
Oliveira Dias, Politólogo