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Pérola do Atlântico versus Diamante do Funchal

No caso das Regiões Autónomas, parece claro que sem prejudicar a sua autonomia, o seu sistema politico-administrativo não se podia afastar do sistema nacional

Desde Fevereiro de 2010, fatídico dia em que a Madeira, conhecidíssima por “pérola do atlântico” foi engolida pela natureza, numa mistura de água, pedra, e lama, num desastre natural que ceifou, não se sabe bem quantas vidas, que não se via novo desastre, este já não pela mão da mãe natureza, mas, por via dos homens que por lá habitam, mandam e comandam.

O desembarque na Região Autónoma da Madeira de uma força policial e judiciária de uma centena de inspectores, transportados numa aeronave militar, com o objectivo de executar mandatos de buscas e detenção de figuras de proa da politica madeirense, provocou um verdadeiro marmoto, ainda em curso, cujas consequências ninguém ousa antecipar.

Nada mais, nada menos que o inquilino da quinta vígia, Miguel Albuquerque, Presidente do governo regional, e o inquilino dos paços do concelho funchalense, o Presidente da Câmara Municipal, Pedro Calado, os dois mais importantes politicos madeirense, no activo, foram o alvo da task force que voou para a pérola do atlântico.

Ambos, no passado, foram “unha com carne” um do outro, quando Miguel Albuquerque foi Presidente da Câmara Municipal do Funchal, e Pedro Calado o seu número dois, e ambos granjeavam o antagonismo do todo poderoso Alberto João Jardim, então Presidente do governo regional da Madeira, contando como seu Vice-Presidente Cunha e Silva, seu delfim, e putativo herdeiro político, estatuto que Manuel António, então um todo poderoso secretário regional, também beneficiava, perdendo os três (Alberto João Jardim, Cunha e Silva e Manuel António) para a “entourage” de Miguel Albuquerque, que tinha então uma aura de empatia e simpatia, próximo das pessoas.

Naturalmente Avelinho Farinha, o “homem” da AFA, também conhecida lá na pérola como a “Mota Engil madeirense”, num paralelismo ao métier a que se dedicavam, quase em monopólio, era um denominador comum, não só a estes nomes, mas a todos os Presidentes de Câmara da Região Autónoma da Madeira.

Residi na Madeira de 2005 a 2010, e as minhas funções de chefe de gabinete de um dos Presidentes de Câmara municipal, habilitam-me a afirmar, com toda a propriedade – conheço-os a todos, sem excepção, pessoal e profissionalmente.

Acrescento, até, que foi graças a mim, que o Presidente de Câmara que servi, em São Vicente, José Humberto de Sousa Vasconcelos, se aproximou do círculo próximo de Miguel Albuquerque, cujo corolário, uns anos depois, foi a escolha de Humberto, por Miguel Albuquerque, para secretário regional, em dois mandatos consecutivos, tendo-se destacado, dos demais, pela positiva, segundo informações que me chegavam.

E é tudo quanto direi nestas páginas sobre estes nomes, fazem parte da minha história, do meu percurso, da minha aprendizagem de vida, e não cometerei o erro de fazer juízos de que espécie for, pois não sou nem juíz, nem jurado.

Esta operação da Policia Judiciária, e do Ministério Público, há muito esperada, por muita gente, na região, vêm como que reabilitar, ou melhor dizendo, restaurar o élan destas entidades, cuja percepção pública, face a desaires recentes, não os cotavam lá muito bem., devido a algumas trapalhadas, admissíveis ao vulgo cidadão, com instrução minima, ao nível da quarta classe, mas inaceitável a agentes diplomados com licenciaturas.

Mas, esta acção não está isenta de falhas grosseiras, e vazamento de informações para o domínio público, com inconfessados propósitos.

Quando se “liberta” a informação que foi confiscado um diamante, embrulhado em papel vegetal, que se encontrava na secretária do Presidente da Câmara do Funchal, à vista, portanto sem estar em gaveta ou fosse o que fosse, de imediato se instala na mente do vulgo, um apodo de culpabilidade mafiosa de Pedro Calado, como se, para além de Presidente da Câmara, acumulasse o trafico de pedras preciosas. Achei muito estranho, inverosímil até, esta versão, não estava a ver uma tamanha ingenuidade.

Dez dias depois, vem-se a apurar que afinal o diamante, não é um diamante mas uma amostra, sem qualquer valor comercial, num material plástico, produzido por uma empresa madeirense.

Parafraseando o “Diácomo remédios”, não havia necessidade. Foi um disparate a divulgação desta informação, sem antes a ter confirmado ou infimado, como veio a acontecer, mas tarde de mais, o labéu , a lama já tinha sido lançada. Não ocorreu a ninguém perguntar ao homem “o que isto?”.

Também passou para domínio público, o trabalho do Ministério Público, prontamente noticiado em todas as TV´s, o número avassalador de milhões de euros em obras públicas, facturado por Avelino Farinha e a sua AFA, e derivadas, no arquipélago, bem como os contratos por ajuste directo, adjudicados quer pela Câmara Municipal do Funchal, quer do Governo Regional, num claro apodo de ilegalidades várias, envolvendo alegados atos de corrupção.

Isto um pouco á semelhança de a nível nacional se diabolizarem os ajustes directos como se não estivessem previstos no Código da Contratação Pública.

E é preciso ter muito cuidado, e cabe ao ministério público garantir a retidão das informações que traz ao processo, por um lado muitos dos milhões facturados pela AFA e derivadas, foram-no ao abrigo de processo concursal público, e, ou conseguem provar que esses processos foram realizados com violação do código da contratação, ou pelo simples facto de terem sido realizados e ganhos pela AFA isso, por si só, não é crime, nem podia ser. Sendo a AFA uma empresa da Região é natural ser a mais solicitada pelos agentes públicos para as diversas obras que ao longo dos 50 anos de autonomia têm existido.

Com os ajustes directos, sucede exactamente a mesma coisa, são legais, estão previstos no Código da Contratação Pública, é preciso, sem sombra de dúvida, que se prove terem sido concretizados em violação da lei, dando preferências indevidas, pois a existência, de per si, destes justes não indicia rigorosamente nada.

Outro apontamento, na peça do MP tornada pública, é a constatação de ao referirem-se a determinadas câmaras municipais lhes atribuírem NIF (números de identificação fiscal), a título de identificação, quando têm de saber, os senhores magistrados do MP que uma Câmara Municipal é apenas um órgão da pessoa jurídica que é o Município, logo é este, a pessoa colectiva de direito público que é titular de um NIF e não o seu órgão executivo colegial.

Por último, mas não o último, é a inconstitucionalidade que impunemente os nossos tribunais vão praticando no que concerne ao prazo para os detidos serem presentes a um juíz – são 48 horas, e no caso em apreço os 10 dias, que os detidos aguardaram para serem ouvidos, esbarram estrondosamente com a lei, porque os tribunais superiores resolveram dar como orientação que qualquer detido ao ser presente apenas para identificação, assegura essas 48 horas, ao arrepio de todas as interpretações do mundo do direito em Portugal. Chega-se ao cúmulo dos juízes defenderem a alteração da lei, não no sentido de serem forçados a cumprir com o que já a lei impõe, mas para alargar esse prazo a fim de cobrir aquilo que eles impõem aos detidos.

Os senhores deputados têm de fazer alguma coisa em relação a isto, já que os juízes insistem em fazer vista grossa.

Como exigir ao outro que seja cumpridor se o juíz, ele próprio não cumpre e o MP comete erros grosseiros?

Por último, mas não o último, é a sacrossanta corrupção, motivada ou fomentada, por décadas ininterruptas de poder por parte dos mesmos, ou mesmo até, no caso das autarquias, dos 3 mandatos sucessivos permitidos pela lei da limitação de mandatos.

A única solução, que no imediato, podia mitigar e prevenir a corrupção era cumprir o desiderato constitucional de fazer os órgãos executivos responderem de facto e de direito aos respectivos órgãos deliberativos, algo que não acontece, pois nas autarquias locais, ao nível do município ainda vigora a bizarria da eleição independente para a câmara municipal e para a assembleia municipal, quando o executivo devia emanar do deliberativo e este devia efectivamente poder destituir o executivo sempre que o considerasse adequado, e mais, as deliberações do executivo deveriam poder ser avocadas pela assembleia no caso de contratação pública, e outras a estudar, pois assim seria muito mais difícil instalar-se a corrupção.

No caso das Regiões Autónomas, parece claro que sem prejudicar a sua autonomia, o seu sistema politico-administrativo não se podia afastar do sistema nacional.

Oliveira Dias, Politólogo

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