Big Brother

A democracia está objectivamente em causa, quando acontecem estas coisas, e a culpa morre solteira. Os magistrados judiciais, de mãos dadas com os magistrados do ministério público, não temem ninguém, porque sabem serem intocáveis.

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O “grande irmão” surge no nosso imaginário como o “olho” que tudo vê, não o olho maçónico de Osíris, mas sim o olho tecnológico que tudo espia, esbulha a nossa privacidade, em nome de um bem “maior”, o da putativa segurança.

Parece quase um axioma, esta necessidade securitária.

Outro axioma, aceite com naturalidade, na ciência e práticas constitucionais é da bem-dita “separação de poderes”, que mais parece um eufemismo para designar a sacrossanta independência dos poderes judiciais, em detrimento dos demais poderes de soberania, entenda-se a assembleia da República e o Governo, curiosamente, estes com legitimidade democrática, ao contrário do poder judicial, que não vai a escrutínio popular.

Como se pode falar em separação de poderes quando um deles – o poder judicial – pode a seu bel prazer sujeitar a vigilância os demais poderes soberanos?

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Uma coisa é, no âmbito de uma investigação judicial, outros órgãos de soberania puderem vir a estar na posição de serem objeto de escutas telefónicas, tendo, estas, forçosamente, de ter um respaldo fundamentado, serem limitadas no tempo e na matéria.

Outra coisa bem distinta, é membros do governo serem objecto de escutas, durante anos, sem que se vislumbre a sua fundamentação, a sua necessidade, e a sua finalidade, que não seja a de colocar membros de outros órgãos de soberania sob vigilância permanente.

Pior ainda, porque indicia uma intencionalidade, é a libertação para o espaço da opinião pública e publicada de excertos truncados de escutas, que nada têm a ver com o cerne da investigação onde foram feitas as escutas, mas que se referem a questões completamente laterais, do foro meramente político, e que apenas servem para incendiar a opinião publicada.

Em termos abstratos isto causa algum desconforto. Mas a partir do momento em que passa a factualidade, então temos razões para ficar assustados.

Em 4 anos António Costa esteve em escrutínio, sob a forma de escutas, e João Galamba 3 anos, e já antes José Sócrates esteve também vários anos debaixo de vigília securitária.

No caso de António Costa esta vigília passou por 16 juízes. As peças tornadas publicas estavam á guarda do Ministério Público, e segundo noticias vindas a lume, quando um Juiz as mandou destruir por serem insignificantes para o caso concreto no âmbito do qual forma recolhidas, o Ministério Público recorreu contra essa destruição … porquê? Dito de outra forma, porque razão o Ministério público foi contra a destruição de umas escutas, que nem deviam ter sido tiradas?

Se era para serem vazadas, como foram, então percebe-se o “leit motiv”.

E é este Poder Judicial, o único órgão de soberania não sujeito a escrutínio eleitoral, que é responsável por este tipo de coisas.

A democracia está objectivamente em causa, quando acontecem estas coisas, e a culpa morre solteira. Os magistrados judiciais, de mãos dadas com os magistrados do ministério público, não temem ninguém, porque sabem serem intocáveis.

E quando o poder politico, se dispõe a discutir o estado a que a justiça chegou, aqui d’el rei, é vê-los (aos juízes e procuradores) queixando-se de quererem beliscar a sua independência.

A coroar tudo isto temos a pior Procuradora Geral da República, que em condições normais já há muito teria sido afastada do cargo, por demissão ou renúncia.

A “créme de la créme” é a senhora Procuradora Geral da República, quando instada a comparecer perante o Parlamento, no decurso da aprovação dos pedidos de audição, por iniciativa quer do PAN quer do bloco de Esquerda, para discutir o Plano de Atividades da Procuradoria, ambos com urgência, na medida em que se aproximam as férias judiciais, e fecha tudo, ou quase tudo, vem solicitar, a senhora Procuradora Geral, informar ao Parlamento que tem disponibilidade para aceitar a audição, mas precisa que lhe deem mais umas semanas, pois o Relatório de Actividades, que a Lei manda estar concluído, e divulgado até 31 de Maio, ainda não está feito.

Dito de outra maneira, a Assembleia da República, órgão de soberania, representativo, recebe de um órgão de estado, que não de soberania, como é a Procuradoria Geral da República, algo como “ok, vou, porque me apetece, mas têm de esperar porque não cumpri o prazo a que estou obrigada, para fazer o relatório de actividades, e já agora esperem lá, e só depois da abertura da sessão legislativa lá para 15 de Setembro, veremos a minha agenda”, e com isto é só mais um empurrãozinho com a barriga, e como o mandato da senhora termina em Outubro, com jeitinho, consegue furtar-se á audição.

Acresce que esta obrigação de apresentação institucional, do Relatório de Actividades da Procuradora Geral, segundo o jornal Público de 4 de Julho de 2024, não é cumprida desde 2019.

Se isto não é gozar com quem trabalha, então não sei o que será.

Sim, o papel dos procuradores, e da Procuradora Geral, tem de ser revisto.

Sim, tem de se apurar responsabilidade na fuga do segredo de justiça e mandá-los para o desemprego.

Sim, quando o titular do cargo de Procurador Geral da República, incumprir com o seu papel constitucional e institucional, deve ser demitido.

E sim, os eleitos dos órgãos de soberania têm de ter imunidades, antes e depois de estarem nos cargos, e se as decisões sobre as suas actuações tiverem de passar pelo crivo de tribunais e outros órgãos, cumulativamente, então que sejam, mas o que não pode acontecer é um cidadão ter medo de ser governante.

E sim, os prazos dos códigos e das Leis, penais, têm de ser taxativos, e não meramente indicativos, como o determinam os tribunais, ilegalmente, porque não têm a prerrogativa de legislar, logo não podem decidir algo que a Lei não lhes atribui.

O poder político, pode e deve intervir para acabar com o regabofe.

Afinal quem tem o beneplácito popular são os deputados, os ministros, e o Presidente da República. Os demais órgãos, de soberania ou não, submetem-se-lhes, por via legislativa.

A afirmação, estafada, de “não é oportuno” é como aquela que nunca casou por estar sempre á espera do momento oportuno … nunca mais chega, e só serve àqueles a quem interessa a manutenção do actual “status quo”.

Se o Povo é quem mais ordena, então seja feita a sua vontade.

– Oliveira Dias, Politólogo

Outros artigos de Oliveira Dias

Big Brother na Wikipédia

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