O CENTRO SOCIAL DO BAIRRO NOVO DO TRIGACHE!
A disseminação de bairros, com origem nos “famigerados” bairros clandestinos, mais tarde classificados como “AUGIS” (área urbana de génese ilegal), nas últimas três décadas do século passado, fixando uma população de milhares de pessoas, fomentou o nascimento do município e Concelho de Odivelas do qual foi o corolário natural, muito ficou a dever à capacidade dos cidadãos que escolheram esta terra, como a sua “casa”, ou o seu “ba” como diriam os japoneses.
Já o disse e assinalei, que essa capacidade, esse querer das populações, teve a sua expressão, no antigo território de Loures, hoje Odivelas, na Freguesia de Famões, com os dois primeiros bairros clandestinos a serem legalizados com o Alvará de Loteamento, nomeadamente, o Casal da Silveira e o Bairro Novo do Trigache.
O Bairro Novo do Trigache, beneficiou da circunstância de ter uma dimensão pequena, bem ordenada, em matéria de edificações, e uma população sempre pronta a contribuir para o fomento da qualidade de vida, via estruturas populares, vulgarmente conhecidas como “Associação de Proprietários” e ainda “comissão de moradores, ou proprietários”.
Reconhecidamente a, então designada, Associação do Centro Social, do Bairro Novo do Trigache, teve um papel determinante na infra-estruturação do bairro, com as inúmeras presenças em sessões da Câmara Municipal de Loures, bem como nas sessões da Assembleia Municipal de Loures, para além das reuniões com diversos responsáveis dos departamentos urbanísticos de Loures, para levar a bom porto a pretensão de legalização do Bairro Novo do Trigache. E com sucesso, isso é inegável.
Nessa época o “povo” do Bairro Novo do Trigache organizava-se para dar força braçal ao arranjo de caminhos municipais, fornecendo o município de Loures a maquinaria necessária para o efeito, e todos os bairros, servidos por esses caminhos municipais, beneficiavam deste trabalho.
Depois do “povo” do Bairro Novo do Trigache ter contribuído dessa forma, para beneficio de todos os outros, também, uma altura houve em que a Comissão de Proprietários do Bairro Novo do Trigache, sentiu ser chegada a vez de fazerem algo, especificamente para o bairro, aproveitando os terrenos ofertados no processo de legalização, para a zona de equipamento social, exigidos pelas regras de legalização.
Foi assim que, novamente com o trabalho braçal, dos proprietários do Bairro Novo do Trigache, se procedeu à construção do assim chamado Centro Social do Bairro Novo do Trigache, mesmo ao lado do parque infantil e jardim, um equipamento agregador das forças vivas do bairro, tendo sido durante muitos anos, a centralidade social, recreativa e festiva do bairro, com as suas festas organizadas pelo bairro, a marcarem o calendário do verão.
Para além das festas dos santos populares, com as suas tradicionais fogueira enormes, apelando à testosterona dos jovens que por cima dela saltavam, para infelicidade das moças, que, durante o baile nas danças, tinham de suportar o cheiro a fumo dos cabelos e sobrancelhas queimadas pelos saltos dos moçoilos, chegou a ser organizada uma tourada, com toiros, mansos claro, coisa única em Famões e arredores.
Fora das festividades os vários corpos sociais da associação foram dando uma utilização permanente daquela infra-estrutura em beneficio de todos, de que se destaca a exploração de café aos fins de semana.
Com o passar dos anos, mudanças de direcção, por vezes com muita dificuldade em constituir os órgãos sociais, por falta de empenho dos associados, a dinâmica colectiva foi esmorecendo, até definhar completamente, e o centro perdeu o brilho de outrora.
Até às portas do Covid, em 2019, o Centro já não passava de um edifício, sem uso, sem brilho.
A população, a Associação, nunca foram, juridicamente, titulares da propriedade daquela infraestrutura, a qual, registe-se, foi edificada, em terrenos propriedade do município de Loures, e com autorização da câmara municipal de Loures.
A titularidade da propriedade, haveria de passar para o Município de Odivelas, com a criação deste, pese embora nem os serviços do Município de Odivelas, nem os seus órgãos representativos, se tivessem dado conta da titularidade daquele património.
Perante isto a posse do património continuou a cargo da Associação do Bairro, mesmo quando esta já não tinha qualquer actividade.
Com a chegada do COVID em 2019, o Centro Paroquial e Comunitário de Famões, face à escassês de recursos próprios, olhou para aquela infraestrutura como uma solução de armazenamento, das toneladas de bens que lhe iam chegando de diversas proveniências, sobretudo roupas e calçado.
Como na Câmara Municipal de Odivelas, e nos seus serviços, não existia informação sobre aquele património, desconhecendo, inclusive, que era seu, a Direcção do Centro Paroquial, pediu-me ajuda no sentido de chegar à fala do Presidente da Associação, meu vizinho, e intermediar, fazer a ponte, com a Associação avaliando a possibilidade de passarem a utilização daquele património para o centro paroquial a fim de ser utilizado com a finalidade de auxiliar a comunidade.
Sempre disponível para ajudar, acompanhei os elementos da direcção do centro paroquial e fomos falara com o Presidente da Associação. Este compreendendo a necessidade que urgia colmatar, por um lado, e por outro da utilidade da iniciativa, tirando do marasmo aquele património, informou que entregaria a chave, se lhe entregassemos um abaixo assinado dos proprietários concordando com isso, em vista o objectivo pretendido.
Foi assim que acompanhei a “volta” pelo bairro, e falei com todos os vizinhos, explicando os motivos e os objectivos do abaixo assinado. Se os elementos do centro paroquial eram desconhecidos, já eu fui reconhecido por todos os vizinhos, afinal ali criado desde os 14 anos, foi decisiva a minha intervenção. E foi assim que o Centro Paroquial de Famões assumiu aquele património. Não nego que fiquei satisfeito, de, mais uma vez, ter dado o meu contributo em prol da comunidade.
Do objectivo inicial, depósito e armazenamento de roupas, rapidamente se percebeu que aquele edifício era o ideal, com alguns obras, para ali implantar serviços de apoio à comunidade, por parte do Centro Paroquial de Famões, entre eles uma cozinha comunitária e outros serviços do Centro Paroquial.
As obras de adaptação só começaram, este ano 2024, mas já foi anunciado que no próximo dia 2 de Outubro, será devidamente inaugurado, com a presença do senhor Cardeal de Lisboa e do senhor Presidente da Cãmara Municipal de Odivelas.
É legitimo afirmar que com esta nova utilização deste património municipal, erigido pelo povo do Bairro Novo do Trigache, encontra, agora uma nova vida, quiçá, recuperando a sua antiga glória.
Ainda bem.
Oliveira Dias, Politólogo
Publicado no Semanário NoticiasLx:
