Uso de carros de serviço nas deslocações pendulares agrava a dependência do transporte individual e vai contra políticas climáticas
A ZERO condena firmemente parte do recente acordo tripartido assinado entre o Governo, as confederações patronais e a União Geral de Trabalhadores (UGT), que prevê uma redução das taxas de tributação autónoma aplicadas a viaturas e um aumento dos limites de custo de aquisição sobre os quais incidem estas taxas. A ZERO considera que estas medidas representam um sério retrocesso nos esforços de descarbonização do setor transportes que representa neste momento mais de 30% do total de emissões do país.
Esta medida é um claro incentivo para que nas empresas se continuem a privilegiar o uso ineficiente do automóvel nas deslocações entre a casa e o trabalho, em vez de reduzirem a oferta de veículos – a maioria com motor de combustão – combustível ou estacionamento nos seus edifícios e promoverem alternativas de mobilidade sustentável, nomeadamente através da oferta de passes que permitem o uso dos transportes públicos e de um plafond mensal para viagens com recurso a táxis e TVDEs de uso partilhado. Mesmo que o incentivo fosse exclusivo para veículos elétricos, continuaria a ser um problema, embora de menor dimensão. Os carros elétricos consomem energia, utilizam materiais escassos cuja extração tem impactos sensíveis, inclusive no território português, e contribuem para o congestionamento nas cidades. O foco deve estar em promover modos de transporte mais eficientes e sustentáveis, como transportes públicos regulares, soluções de mobilidade flexível e partilhada e modos ativos, concentrando os incentivos à eletrificação nos veículos com elevadas taxas de utilização, como os pesados de mercadorias e de passageiros, os ligeiros de mercadorias ou os Táxis e TVDEs, sobretudo de uso partilhado e os veículos para aluguer.
O que é a taxa de tributação autónoma?
A tributação autónoma é um imposto que as empresas pagam sobre certas despesas, como os custos relacionados com veículos de empresa. Este imposto aplica-se independentemente de a empresa ter lucro ou não e visa evitar que esses benefícios sejam usados de forma desproporcional para fins pessoais. Ao reduzir estas taxas, o Governo está a facilitar e incentivar o uso de automóveis, mesmo que não tenham uma utilização intensa – mais de 50 000 quilómetros por ano – e mesmo que sejam movidos a combustíveis fósseis, o que contribui para manter o atual modelo de mobilidade assente no uso ineficiente do automóvel e de combustíveis fósseis, contrariando as orientações europeias relativas à promoção da mobilidade como serviço, mantendo o país muito longe da necessidade de reduzir as emissões no setor dos transportes em 5,3% no ano de 2025 e tornando mais difícil o cumprimento dos objetivos do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC).
Fiscalidade favorece o uso de automóveis e a dependência dos combustíveis fósseis
Estudos indicam que uma grande parte dos veículos que entram diariamente em Lisboa e Porto são automóveis fornecidos pelas empresas, chegando em alguns eixos a ser mais de metade do total dos veículos em circulação Este modelo altamente ineficiente prejudica a economia e a sociedade no seu conjunto agravando o congestionamento e com ele penalizando os tempos de viagem, a produtividade laboral, e o tempo de lazer das famílias; mantendo a poluição atmosférica nas cidades a níveis perigosos para a saúde o que tem pesados custos para o Serviço Nacional de Saúde, para o orçamento das famílias e para a qualidade de vida e a produtividade do trabalho; fragilizando a economia conservando a sua dependência de combustíveis fósseis que de tempos a tempos têm picos inflacionários; e por fim comprometendo as metas de redução de emissões de gases com efeito de estufa a que Portugal se comprometeu. O acordo, a entrar em vigor em 2025, reduzirá as taxas de tributação autónoma aplicadas a viaturas e aumenta em 10.000 euros os limites de custo de aquisição, o que é um claro incentivo para que as empresas continuem a beneficiar de vantagens fiscais, encorajando o uso ineficiente do automóvel incluindo veículos a combustão e subsidiando indiretamente o uso de combustíveis fósseis, o que contraria os objetivos europeus e a lei de bases do clima no que que apontam para o fim destes incentivos perversos.
ZERO apela à revisão destas medidas no OE 2025
A ZERO apela ao Governo e às partes envolvidas para que revejam as suas posições e aos partidos envolvidos na negociação orçamental que quantifiquem esta despesa fiscal e corrijam as medidas relativas à descida de tributações autónomas na aquisição de veículos a combustão ou de elétricos que circulem menos de 50 000 km por ano. Ao invés o próximo orçamento de Estado deverá canalizar 15% dos impostos rodoviários (ISP, ISV e IUC) para o investimento em sistemas de transporte público incluindo em sistemas flexíveis de mobilidade partilhada e em modos ativos e outros 15% dos impostos rodoviários – cerca de 600 milhões de euros – em incentivos à eletrificação de veículos com intensa utilização, que percorrem mais de 50 000 km por ano, bem como à criação de áreas dedicadas exclusivamente ao carregamento deste tipo de veículos.
A crise climática não pode ser ignorada, e decisões como estas representam mais um perigoso desvio dos compromissos de Portugal para a descarbonização e para a proteção do ambiente.
Fonte: Zero.ong