ORDENE-SE Á FREGUESIA …

As freguesias são um tipo de administração pública especial, porque descentralizada, sendo a sua principal característica a autonomia perante outros poderes, sejam decentralizados, sejam desconcentrados, e apenas está sujeita aos poderes de tutela administrativa, consubstanciados na mera verificação da conformidade dos actos e contratos dos titulares dos respetivos órgãos. Um Tribunal judicial pode ordenar determinada prática a uma freguesia, mas em decisão condenatória transitada em julgado, mas nem o Tribunal judicial pode ordenar a um Presidente de Junta o que incluir nas ordens de trabalho que haja por bem fazer, muito menos o Ministério Público.

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É sempre mau quando as freguesias são notícia pelos piores motivos, mas sendo estas o patamar do Estado mais próximo do cidadão, é natural estar sujeita a pressões e acções, nem sempre as melhores, é um pouco aquele jargão popular “quem anda á chuva molha-se”.

Esta semana é o processo “tuty frutty” a merecer destaque, envolvendo várias freguesias da capital, em alegados esquemas de corrupção para obtenção de vantagens.

Os visados são, claro está, os respectivos Presidentes de junta, uns acumulam o cargo com o mandato de deputado á Assembleia da República, outros com cargos partidários, daqueles que decidem putativos candidatos ás autárquicas, que se aproxima, diga-se “en passant”, mas todos com acento na Assembleia Municipal de Lisboa, portanto colegas.

A proximidade que o acento naquele órgão deliberativo proporciona, segundo certa apologia, alegadamente favorece proximidades, e cumplicidades, chegando-se ao ponto de, segundo se acusa, articularem entre si, e partidos, quem deverá encabeçar listas em detrimento de outros, abrindo a possibilidade de se ser eleito para esta freguesia, eu, naquela tu, naquela outra logo se vê.

É extraordinariamente difícil de se provar este tipo de conluio, de combinação de composição de listas, tal cenário roça o delírio, pois não sendo impossível, tenho uma enorme dificuldade em acreditar que um partido elabore uma lista, escolhendo os piores para perder, para dar a hipótese a outro partido de ganhar as eleições.

Externamente, aos partidos, um acto eleitoral não é controlável, na medida em que é o povo quem mais ordena no acto de colocar o boletim na urna.

Internamente, nos partidos, só quem nunca esteve próximo dos procedimentos internos de elaboração de listas para autárquicas, e não só, pode entender a intricada rede de interesses, e vontades pessoais, amizades, subjacentes á luta interna na formação de listas de candidatos.

Enfim, afigura-se fadado ao insucesso qualquer processo judicial visando entendimentos obscuros na formação de listas de candidatos ás autárquicas. Nem se percebe porque razão se aposta nessa “linha” de investigação.

Mas o processo “tuti fruti” contém também outras linhas de investigação relacionadas com a prática de corrupção, para obtenção de vantagens, alegadamente lesando as respectivas freguesias, que é como quem diz o erário público.

A ser verdade, consequentemente, ao assim serem condenados os visados, entretanto constituídos arguidos, no caso os Presidentes das juntas em causa, haverá lugar a responsabilidade financeira e os condenados, sendo o caso, terão de ressarcir as respectivas autarquias dos montantes que vierem a ser apurados, para além de outras penas, sejam elas principais ou acessórias.

O Ministério Público, a crer no que tem sido noticiado, optou por notificar as freguesias em causa para se constituírem assistentes nos processos, visando, segundo veio a público, terem acesso a pedidos de indemnizações cíveis, em caso de sentença condenatória.

A constituição como assistente, num processo, é um estatuto do qual resulta “á priori” uma concordância com a acusação, ora resulta daqui que o Ministério Público quer que os acusados Presidentes de Junta, concordem com a acusação de que são objeto.

Na verdade, imaginem lá um Presidente de Junta que é acusado pelo Ministério Público de corrupção, presidir a uma reunião de junta, onde um dos pontos da ordem de trabalhos, que é feita por ele próprio, é deliberar a freguesia constituir-se como assistente … contra si próprio.

Quase parece uma piada. Mas não é.

Porém, e para descanso dos Presidentes de Junta visados, e salvo melhor opinião, o Ministério Público não pode dar ordens a uma freguesia, nem a nenhum dos órgãos representativos, porque isso seria desconsiderar o princípio da descentralização do estado.

As freguesias são um tipo de administração pública especial, porque descentralizada, sendo a sua principal característica a autonomia perante outros poderes, sejam decentralizados, sejam desconcentrados, e apenas está sujeita aos poderes de tutela administrativa, consubstanciados na mera verificação da conformidade dos actos e contratos dos titulares dos respetivos órgãos.

Um Tribunal judicial pode ordenar determinada prática a uma freguesia, mas em decisão condenatória transitada em julgado, mas nem o Tribunal judicial pode ordenar a um Presidente de Junta o que incluir nas ordens de trabalho que haja por bem fazer, muito menos o Ministério Público.

Resulta daqui que compete ao Presidente da Junta, e no limite aos seus vogais, que podem sugerir matérias a incluir na ordem de trabalhos, decidir se sim ou não se constituem como assistentes neste ou naquele processo.

O argumento de que essa constituição como assistente, é para garantir o ressarcimento à freguesia, em caso de condenação, não colhe, porque isso já está assegurado pela lei da tutela administrativa, mas tem que ser á posteriori da condenação, e nunca antes da mesma.

Dito de outra maneira, e se fosse eu um dos Presidentes de Junta visados, limitava-me a informar o Ministério Público que estava a ultrapassar as suas competências, e que por essa razão não faria o que me ordenava.

Oliveira Dias, Politólogo

Publicado na Revista NoticiasLx:

NoticiasLX de 15 de Fevereiro de 2025 – Loures e Grande Lisboa Informação | Opinião | Área Metropolitana

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