De bacalhoeiro a ‘cruzeiro’ de vocação cultural – Um veleiro português, pois com certeza

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O Santa Maria Manuela é um veleiro português, um antigo bacalhoeiro transformado uma espécie de ‘cruzeiro’ cultural de vocação marítima. Atracou em santa Cruz de Tenerife no dia 29 de março com turistas, para uma visita de 12 horas, antes de zarpar para Lanzarote. Em cima da hora da partida não tivemos tempo para conhecer esta preciosidade da antiga construção naval portuguesa. E menos para recordar o calvário da arte da pesca ao bacalhau no Noroeste do Atlântico. Quantos de nós não imaginamos a complexidade da pesca do bacalhau que nos caia na mesa. Quantos somos capazes de idealizar um só pescador ser lançado ao mar nuns dóris de madeira, com dois remos, para estender uma arte de pesca, num mar retorcido, gelado e debaixo de um ambiente hostil, diria mesmo infernal… Nem tão pouco se rezava por eles nas ceias de Natal.  

O Santa Maria Manuela é um dos quatro sobreviventes da designada ‘Frota Branca Portuguesa’. Os outros três navios são o “Creoula”, o “Argus” e o “Gazela”. Foi construído nos estaleiros da CUF, a Companhia União Fabril, em Lisboa, por iniciativa de Vasco Albuquerque d’Orey. Foi baptizado com o nome do cônjuge: Maria Manuela de Sampaio d’ Orey. Em simultâneo fabricou-se o irmão “Creoula” que actualmente se encontra na frota da Marinha Portuguesa desde 1985 dedicado a treino de Mar. É um dos poucos grandes veleiros europeus que conta com uma guarnição mista, militar e civil. Embora operado como Navio de Treino de Mar (NTM), está classificado como Unidade Auxiliar da Marinha, UAM com o número 201. Tem um recorde no seu historial: Foi constru+ido em apenas 62 dias.

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Santa Maria Manuela é um dos quatro sobreviventes da designada ‘Frota Branca Portuguesa’ que são o “Creoula”, o “Argus” e o “Gazela”. Foi construído nos estaleiros da CUF, a Companhia União Fabril, em Lisboa, por iniciativa de Vasco Albuquerque d’Orey. Foi baptizado com o nome do seu cônjuge: Maria Manuela de Sampaio d’ Orey. Em simultâneo fabricou-se o irmão “Creoula” que actualmente se encontra na frota da Marinha Portuguesa desde 1985, dedicado a treino de Mar. É um dos poucos grandes veleiros europeus que conta com uma guarnição mista, militar e civil. Embora operado como Navio de Treino de Mar (NTM), está classificado como Unidade Auxiliar da Marinha, UAM com o número 201. O Creoula bateu o recorde de construção: 62 dias –  (fotografia no sítio da empresa Recheio em satamariamanuela.pt)

Tal como o Creoula foi construído em 1937. Data absoluta do lançamento à água só se conhece a do veleiro Creoula: 10 de maio de 1937.

Santa Maria Manuela é um lugre de quatro mastros, que como significa é um veleiro onde são utilizadas velas latinas quadrangulares. E por ser destinado a navegar em águas revoltas e geladas, as obras-vivas à vante, particularmente a roda de proa, tiveram construção reforçada. O convés é numa madeira de teca que sobressai à vista de quem viveu o mar em vários momentos. Devo o esclarecimento para quem desconhece a arte de navegar e as embarcações mais extraordinárias, a Teca é praticamente insubstituível, pois resiste ao sol, calor, frio, à água salgada do mar e das chuvas. Continua a ombrear com os conveses dos grandes navios em aços tratados ou das embarcações de recreio dos últimos 25 anos, onde se usam as fibras, resinas, com misturas de carbono e malha de titânio (conhecido como carbo-titânio na indústria automóvel). A teca, conhecida como tectona grandis, e popularmente como Teka, é das mais leves, tem resistência à tracção, é durável estável e particularmente flexível a maiores esforços.

O interior do Santa Maria Manuela é revestido a madeira – acredita-se que com trilhados em Cedrinho, Ipê e End Grain, enquanto o porão era calafetado para evitar o contacto da salmoura com o ferro. Atualmente as características reveladas são: Comprimento fora-a-fora (com gurupés, ou seja, mastros fixos colocados, quase na horizontal, para vante da proa do navio) é de 68,64 metros, mais quatro metros de que o comprimento do casco propriamente dito que é de 62,64 metros. Já o comprimento, entre perpendiculares, é de 52,68 metros. Tem um pontal, ou seja, a distância vertical entre a linha de água e o convés, de 5,94 metros, enquanto o calado – a distância vertical entre a linha de água e a parte mais baixa do casco – é de 4,51 metros. A ‘boca’ – largura de um bordo a outro – é de 9,90 metros e a área das velas base é de 1.130 m2.

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O antigo bacalhoeiro é propriedade da Recheio, empresa do Grupo Jerónimo Martins, desde 2016. Foi convertido a um veleiro para cruzeiros culturais, onde os turistas participam na actividade da navegação com vela. Rumos fazem-se entre a Madeira e Canárias, entre pelo menos quatro das ilhas do arquipélago espanhol, Madeira e Lisboa e Sul de Espanha. Mas para o final deste mês de abril fará um cruzeiro entre Castellón – Mahon, nas Baleares – Barcelona – (fotografia de José Maria Pignatelli)

Embora seja um veleiro, anuncia-se que a propulsão mecânica do Santa Maria Manuela tem uma potência de 746 kW, o que significa qualquer coisa como 1.014,56 cavalos.

Santa Maria Manuela é propriedade da Recheio, empresa do Grupo Jerónimo Martins. Foi convertido a um veleiro para cruzeiros culturais, onde os turistas participam na actividade da navegação com vela. Rumos fazem-se entre a Madeira e Canárias, entre pelo menos quatro das ilhas do arquipélago espanhol, Madeira e Lisboa e portos do Sul de Espanha… Para este mês de abril está prevista uma viagem Castellón – Mahon, nas Baleares – Barcelona. Em 2024, rumaram também a destinos nos Açores e em Itália

O navio é propriedade da empresa Recheio, do Grupo Jerónimo Martins, desde novembro de 2016 que o converteu numa espécie de cruzeiro cultural que navega em rotas entre a ilha da Madeira, Canárias, Lisboa e Sul de Espanha. A tripulação é de 33 profissionais no máximo, enquanto o número de passageiros pode oscilar entre os 17 e 25 passageiros. Oficialmente, anunciam-se 22 tripulantes para um máximo de 50 participantes. A arquitectura dos camarotes que se conhece é: 12 acomodações duplas; 6 camarotes singulares; 5 para quatro pessoas.

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Camarotes para 2 e quatro passageiros: com a restauração foi assegurada a utilização de materiais de qualidade, principalmente madeiras resistentes às condições marítimas, e a comodidade dos passageiros, embora o objectivo seja a prática de um turismo cultural
e temático com a participação nas tarefas quotidianas do navio – (fotografia no sítio da empresa Recheio em satamariamanuela.pt)

‘Frota Branca Portuguesa’ foi uma designação dada a quatro veleiros bacalhoeiros portugueses que tinham o casco de cor branca para serem facilmente identificados pelos navios de guerra que cruzavam o Atlântico Norte durante a II Guerra Mundial. Cada um destes navios transportava 30 dóris, pequenos botes de madeira utilizados por um único pescador, que estendia uma arte – linha de pesca longa – com inúmeros anzóis para capturar o bacalhau.

O Santa Maria Manuela navegou ao serviço da Empresa de Pesca de Viana durante 26 anos – entre 1937 e 1963 –, participando nas campanhas de pesca do bacalhau ao largo da Terra Nova e da Gronelândia. Depois, manteve-se na mesma actividade, mas como propriedade da Empresa de Pesca Ribau, que tinha sede em Aveiro. No entanto, ainda antes do final da década de 60’, o veleiro foi reformado principalmente para integrar inovações tecnológicas que, entretanto, foram disponibilizadas quer para a marinha mercante em geral, quer para a actividade pesqueira em particular.  Recordamos a introdução do sonar – Sound Navigation and Ranging ou “Navegação e Determinação da Distância pelo Som” – um instrumento que foi utilizado inicialmente em época de guerra para a localização de submarinos, mas que passou a ser equipamento sistematizado na navegação, na pesca, no estudo e pesquisa dos oceanos, incluindo estudos atmosféricos básicos.

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No final da década de 60’, o veleiro foi reformado principalmente para integrar inovações tecnológicas que, entretanto, foram disponibilizadas quer para a marinha mercante em geral, quer para a actividade pesqueira em particular.  Introduziu-se o sonar – Sound Navigation and Ranging ou “Navegação e Determinação da Distância pelo Som” – um instrumento que passou a ser sistematizado na navegação e na pesca – (fotografia de José Maria Pignatelli)

Em 1994, a ‘Fundação Santa Maria Manuela’ – constituída por 17 instituições públicas e privadas – tenta promover a recuperação do veleiro de que apenas restava o casco após ter sido declarado obsoleto e destinado ao desmantelamento, em 1993. Mas o primeiro passo da recuperação foi dado em 2007 pela empresa ‘Pascoal & Filhos, S.A’ que assumiu o projecto da fundação que trasladou o casco para o então estaleiro da ‘NavalRia’, na Gafanha da Nazaré, onde se realizou a recuperação do casco. A restante restauração foi da responsabilidade do estaleiro galego ‘Factoría Naval Marín’, entre 29 de dezembro de 2008 e o primeiro de maio de 2010.

Voltando, à ‘Frota branca Portuguesa’ fica a curiosidade histórica sobre o veleiro Gazela que se estreou na pesca do bacalhau em 1938, sob designação ‘Gazela Primeiro’, após 101 anos da sua construção e três reconstruções, em 1883, 1900 e 1938, esta última para a instalação de um motor de propulsão. Em 1959, substituiu a sobre-quilha e dez anos depois, em 1 de outubro de 1969, depois de um acidente, regressou a Portugal abandonando a actividade piscatória ao bacalhau. Em 1971, passou a chamar-se Gazela of Philadelphia, encontrando-se nos EE.UU. onde tem sofrido diversos restauros após ter sido vítima de uma colisão numa regata.

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De bacalhoeiro a ‘cruzeiro’ de vocação cultural. Um veleiro português, pois com certeza

Hoje, resta-nos não esquecer a história. Felizmente a pesca no extremo Norte do Atlântico faz-se em condições bem distintas. Por exemplo, actualmente, o bacalhau é a única arinca (Melanogrammus aeglefinus da família do bacalhau) ou peixe branco que se salga pescado no Mar de Barents, no Nordeste do Ártico, que estão a prosperar. A biomassa da unidade populacional de bacalhau encontra-se num máximo histórico: estimam-se que existam quase 2 milhões de toneladas. Durante a década de 80’ do século passado, estimava-se uma população inferior a meio milhão de toneladas. Os noruegueses aproveitaram condições ambientais que se mantém favoráveis, e promoveram uma boa gestão, proporcionando, por exemplo que muitas pescarias obtivessem a certificação do MSC, na última década.  

– Texto por José Maria Pignatelli (Texto não está escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico)

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