Revisão constitucional não é monopólio da esquerda
Na sequência das eleições legislativas do passado dia 18 de maio, há em Portugal uma maioria sociológica de direita, superior a dois terços, o que permite uma revisão constitucional, a última das quais feita em 2005, ou seja, há 20 anos.
Desde então, Portugal passou por transformações significativas a nível económico, social, tecnológico e político, o que aconselha uma atualização da Constituição que reflita a realidade atual e responda adequadamente às necessidades e desafios contemporâneos. Uma revisão constitucional permitirá que o país se adapte melhor ao contexto, interno e externo, promovendo um quadro legal mais adequado às exigências e complexidades dos tempos atuais.
A recente intensificação do debate em torno de uma revisão constitucional fez emergir novamente a cerca sanitária ao CHEGA, partido que hoje representa uma parte significativa do eleitorado e que é líder da oposição em Portugal. Com efeito, não faltam vozes a denunciar como uma afronta à democracia a participação do CHEGA na revisão da Lei Fundamental. Despropositado e contrário ao espírito democrático.
Esta narrativa é profundamente errada e perigosa para a saúde democrática do país, porque é própria das oligarquias políticas e contrária às mais elementares regras do pluralismo partidário. As elites da esquerda, sejam políticos, comentadores ou jornalistas, estão visivelmente desconfortáveis e a perder a compostura democrática, perante o medo de lhes ser retirado o monopólio da elaboração e interpretação dos valores constitucionais do país.
É incompreensível que, 51 anos após o 25 de Abril, ainda haja em Portugal tentativas antidemocráticas de interditar do processo da revisão constitucional, um partido político de direita, na circunstância o CHEGA que, pelo voto popular atingiu a posição de líder da oposição.
A Constituição da República Portuguesa não é pertença exclusiva da esquerda, que pretende eternizar, a todo o custo, no texto da Lei Fundamental, os dogmas ideológicos herdados dos idos revolucionários de 1974/75. A Constituição sendo sagrada na sua aplicação, não é imutável, podendo e devendo ser um documento político dinâmico, desprovido de carga ideológica e adaptável às circunstâncias de cada época.
O que as elites políticas e intelectuais da esquerda pretendem com este novo cerco sanitário ao CHEGA, é em primeira linha evitar uma revisão constitucional, mas se tal não for possível então que seja assegurada a presença obrigatória do PS nesse processo, como se fosse um garante da legitimidade democrática.
Este raciocínio parte de uma autêntica distorção democrática porque o PS não é o guardião da Constituição, é apenas mais um partido do sistema político português. Transformar o PS numa espécie de árbitro da legitimidade constitucional é uma tentativa de garantir que as ideias da direita democrática nunca sejam aplicadas, independentemente dos resultados eleitorais que obtenha. Espera-se que a atual liderança do PSD perceba a teia que começa a ser pacientemente urdida pela esquerda para evitar uma revisão constitucional.
O que o PSD tem de compreender é que a revisão constitucional, pode ser feita à esquerda ou à direita, desde que uma maioria parlamentar de dois terços assim decida. É a democracia a funcionar, quem recusar esta evidência está, na prática, a defender que só uma parte do espetro político nacional tem legitimidade para alterar a Constituição. Vivemos em democracia e não podemos aceitar que o PS, em acentuada perda eleitoral, prolongue artificialmente a sua hegemonia no sistema político português.
A maioria qualificada de dois terços para alterar a Constituição, sendo um garante de estabilidade e de pluralidade, tem sido erradamente usada para bloquear sistematicamente qualquer revisão proposta pelos diferentes partidos políticos, nomeadamente, o projeto que o CHEGA apresentou em 2022.
O equilíbrio de dois terços exige maturidade política, compromisso e respeito pela pluralidade de ideias, sendo que essa maioria pode, pela primeira vez na democracia portuguesa, surgir à direita, com um entendimento entre o PSD, o CHEGA e a IL. Recusar esta possibilidade é negar a aritmética parlamentar e transformar a Constituição num documento imune à vontade popular. Isso é inaceitável.
Portugal necessita de uma nova Constituição que valorize quem trabalha e paga impostos, que não trate os criminosos como vítimas da sociedade, mas sim com sanções penais mais pesadas, nos casos de crimes hediondos, que reconheça a importância das fronteiras, da identidade nacional, da disciplina nas escolas e o respeito pela autoridade policial. Uma Constituição que reflita a atual realidade política, social e económica do país e não os fantasmas do período revolucionário.
Na futura alteração constitucional, dever-se-á, sem qualquer tipo de preconceitos ideológicos, questionar os limites materiais à sua própria revisão. Não podem existir matérias constitucionais imutáveis e sem possibilidade de serem alteradas, porque numa democracia plena e saudável, tudo pode ser debatido, reformulado e, se necessário, revogado. Há que retirar da Constituição as matérias ideológicas e programáticas já ultrapassadas e desatualizadas.
O debate sobre a revisão constitucional não se pode focar sobre quem deve ou não participar. Deve ser sobre o que o povo português, pretende para o seu futuro. Nessa perspetiva o CHEGA tem toda a legitimidade para participar, não só porque é o líder da oposição, mas também porque é fundamental para a obtenção de uma maioria de dois terços.
– Fernando Pedroso, Líder da bancada do CHEGA na AMO e Adjunto do Conselho Jurisdição do CHEGA
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