Cloud soberana
Vivemos numa era onde os dados se tornaram o novo petróleo. Controlar onde, como e por quem são processados deixou de ser apenas uma decisão técnica: é hoje um fator de soberania digital e económica. Quando falamos de cloud computing, não falamos apenas de armazenamento ou escalabilidade, falamos de autonomia, de segurança e da capacidade de um país proteger os seus interesses estratégicos num contexto global cada vez mais instável.
Confiar cegamente em infraestruturas de cloud públicas, muitas vezes sediadas fora de jurisdições nacionais ou europeias, expõe países, organizações e cidadãos a riscos graves. Desde a perda de controlo sobre dados sensíveis até à dependência tecnológica de gigantes globais, passando pelo acesso desigual a plataformas críticas ou pela fragilização em cenários de ciberconflito, os riscos são claros. E a atualidade mostra-o de forma crua: os ataques recentes com drones contra infraestruturas críticas na Dinamarca e noutros países europeus são apenas a face visível de uma guerra paralela, cada vez mais silenciosa e híbrida, onde ciberataques e ataques físicos se cruzam para testar a resiliência das nações.
Cloud soberana não é um capricho nem um slogan político
Neste quadro, falar de Cloud Soberana não é um capricho nem um slogan político. É uma necessidade estratégica. A soberania digital não significa fechar fronteiras tecnológicas, mas garantir que os ativos digitais críticos estão sob controlo nacional e que os dados sensíveis, não apenas do Estado, mas também do tecido económico e das empresas, permanecem defendidos e acessíveis em condições de confiança.
Uma verdadeira estratégia de Cloud Soberana exige mais do que servidores em território nacional. Requer localização de dados em jurisdições reguladas, com cumprimento do RGPD, da NIS2 ou do AI Act, por exemplo. Implica plataformas geridas por entidades sob supervisão nacional, com infraestruturas resilientes a ciberataques, interoperáveis com redes globais e preparadas para um ecossistema híbrido. Exige ainda modelos abertos e escaláveis, para evitar lock-ins tecnológicos que comprometam a autonomia de decisão.
A Confiança dos Dados
Não se trata apenas de proteger o Estado. A economia portuguesa, dos setores financeiros à energia, passando pela indústria e pela saúde, depende cada vez mais da confiança nos dados. Um ataque ou perda de controlo pode significar não só a interrupção de serviços essenciais, mas também a perda de competitividade internacional. Empresas que hoje exportam, inovam e atraem investimento não o fazem sem dados seguros e devidamente regulados.
Estamos, portanto, perante um desafio que é simultaneamente técnico, económico e geopolítico. O futuro da soberania nacional e da competitividade das empresas passa por saber quem controla os dados e como se garante que permanecem sob jurisdição e controlo nacional. Porque quem liderar na Cloud Soberana terá mais do que servidores: terá capacidade de decisão, competitividade reforçada e resiliência perante crises globais.

Continuar a navegar na cloud sem saber quem tem o volante?
A questão que se coloca é simples: vamos continuar a navegar na cloud sem saber quem tem o volante? Ou vamos assumir a responsabilidade de construir uma estratégia digital soberana, capaz de proteger os nossos ativos críticos e garantir que estamos preparados para as guerras — silenciosas ou visíveis — que marcam o presente e definirão o futuro?
– Rui Ribeiro
Consultor Transformação Digital e Professor Universitário
Artigos de “Digital a Transformar”
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