Da retirada do Sinai à guerra relâmpago
Quando as tropas israelitas deixaram finalmente o Sinai, em março de 1957, após forte pressão conjunta dos EUA e da URSS através das Nações Unidas, o Médio Oriente entrou numa década de tensão silenciosa — um período onde não havia guerra declarada, mas tampouco existia paz. O armistício pós-Suez parecia, na melhor das hipóteses, um intervalo; na pior, a preparação inevitável para um novo choque armado.
A retirada do Sinai e o frágil “pós-Suez”
A crise de 1956 terminara com a formação da UNEF, a força de interposição da ONU colocada ao longo da fronteira egípcia para impedir nova escalada. Israel, embora frustrado com a retirada forçada, ganhou temporariamente uma sensação de segurança: os ataques vindos da Faixa de Gaza diminuíram e o Estreito de Tiran foi reaberto, permitindo a navegação israelita para o Mar Vermelho.
Mas esta calma era enganadora. O Egito de Gamal Abdel Nasser, derrotado militarmente mas vencedor político no mundo árabe, recuperava prestígio. Os países árabes perceberam a vulnerabilidade do equilíbrio regional e começaram a reforçar exércitos, alianças e estratégias.
A ascensão do nacionalismo árabe e a polarização das alianças
Entre 1958 e 1964, o nacionalismo árabe ganhou nova vitalidade. O Egito tentou liderar uma frente unificada, materializada brevemente na República Árabe Unida (Egito + Síria), enquanto a Jordânia e o Iraque procuravam equilibrar essa influência com o apoio britânico.
Ao mesmo tempo, Israel aprofundava laços com a França, que se tornara o seu principal fornecedor de armamento sofisticado — incluindo os embriões do programa nuclear israelita em Dimona. Paralelamente, Washington consolidava a sua posição como protetor estratégico de Israel, num contexto de Guerra Fria onde o bloco soviético apoiava abertamente os Estados árabes, sobretudo o Egito e a Síria.
A região transformava-se, assim, num xadrez global: armas modernas, interesses das superpotências e rivalidades locais em constante sobreaquecimento.

O Fatah e o nascimento da OLP
Se nos anos 1950 os principais confrontos se davam entre Estados, os anos 1960 assistiram ao surgimento de um novo ator: o movimento palestiniano organizado.
- Em 1959 nasce o Fatah, liderado por Yasser Arafat, que promovia ações de guerrilha contra Israel a partir de Gaza e da Jordânia.
- Em 1964, com apoio dos países árabes, cria-se a Organização de Libertação da Palestina (OLP). Embora inicialmente controlada por governos árabes mais do que pelos próprios palestinianos, a OLP estabeleceu um princípio claro: a luta pela autodeterminação palestiniana ganhava estrutura política.
As ações de fedayeen (combatentes palestinianos) aumentaram, e com elas vieram operações de retaliação israelitas, sobretudo contra aldeias fronteiriças na Jordânia e na Síria.
Da retirada do Sinai à guerra relâmpago
A escalada no norte: Israel e Síria no limiar do confronto
A fronteira síria tornou-se o ponto mais explosivo da década. Disputas por recursos hídricos, sobretudo a tentativa síria de desviar as nascentes do rio Jordão, desencadearam trocas de artilharia e combates diretos.
Em paralelo, a Síria intensificou o apoio a grupos palestinianos, permitindo ataques a partir do Golan. Israel respondia com incursões aéreas e terrestres cada vez mais agressivas. Entre 1964 e 1966, a região do Golan transformou-se num “front congelado”, onde qualquer pequena faísca tinha potencial para desencadear algo maior.
A crise intensifica-se: alianças árabes, retórica e militarização
Entre 1966 e 1967, três movimentos convergiram:
- A Síria pressionava os países árabes para uma postura mais dura contra Israel.
- A União Soviética transmitiu informação errónea ao Egito, sugerindo (sem provas) que Israel preparava uma invasão da Síria.
- A nova liderança militar egípcia procurava restaurar o prestígio do país e demonstrar solidariedade pan-árabe.
Nasser, sentindo-se compelido a reagir, tomou uma série de decisões que mudariam a história:
- ordenou a retirada da UNEF, abrindo a fronteira a possível conflito direto;
- voltou a fechar o Estreito de Tiran aos navios israelitas, considerada por Israel uma “linha vermelha”;
- anunciou pactos militares com a Jordânia e com o Iraque, consolidando uma coligação árabe.
A retórica subia de intensidade. Discursos de rádio, mobilizações militares e declarações de que a “hora da confrontação chegara” criavam um clima em que qualquer passo em falso poderia desencadear a guerra.
Da retirada do Sinai à guerra relâmpago
O caminho para a Guerra dos Seis Dias
Em Jerusalém e Telavive, o governo de unidade liderado por Levi Eshkol debatia-se com o dilema: agir preventivamente ou esperar um ataque árabe coordenado. A pressão popular aumentava, e os generais israelitas defendiam uma ação rápida para evitar uma guerra em múltiplas frentes.
A comunidade internacional tentava moderar a situação, mas sem capacidade real de inverter a espiral. A ONU não conseguiu repor a sua força no Sinai; os EUA aconselhavam prudência, mas não ofereciam garantias de segurança imediata; a URSS, embora cautelosa, continuava a incentivar a retórica árabe.
O Médio Oriente aproximava-se, passo a passo, de um confronto inevitável.
Da retirada do Sinai à guerra relâmpago
Conclusão: uma década de tensão acumulada
A década entre a crise de Suez e 1967 foi marcada por:
- armistícios que não se traduziram em paz,
- ascensão de novos atores, como o Fatah e a OLP,
- confrontos constantes nas fronteiras,
- militarização acelerada,
- e um jogo geopolítico cada vez mais influenciado pela Guerra Fria.
Quando o conflito finalmente rebentou, em junho de 1967, não foi um acidente súbito, mas sim o culminar de dez anos de pressões acumuladas. A “guerra relâmpago” que se seguiria mudaria para sempre o mapa e o equilíbrio político da região.
Da retirada do Sinai à guerra relâmpago
Próximo episódio
“A Guerra dos Seis Dias: vitória relâmpago, ocupação duradoura (1967)”

