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    PORTUGAL DOS PEQUENINOS

    Camões, bem o sabia, existem também uns parolos, paroquiais, que bem podiam figurar no Portugal dos pequeninos, não naquele de Coimbra, mas naquele outro onde os velhos do restelo pululam como baratas.

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    Não, este artigo não é sobre essa infra-estrutura fabulosa, sediada em Coimbra, e conhecida como “Portugal dos Pequeninos”, mas sim sobre um sentimento tão português, infelizmente, como é a mesquinhez, irmã gémea da inveja.

    Circula, por aí uma anedota ilustrativa deste sentimento, mais ou menos nestes termos “um homem estava pacientemente á pesca de caranguejos vivos, e á medida que os apanhava colocava-os num balde, e alguém, observando aquilo, com um ar surpreendido, questionou o pescador se não receava uma fuga dos caranguejos, visto o balde não estar tapado … tendo-lhe respondido o pescador nada recear, porquanto quando um deles lograva alcançar a borda do balde logo os outros o puxavam para baixo”.

    Vem isto a propósito da putativa hipótese de António Costa conseguir a nomeação para o Conselho Europeu, oportunidade rara e única, para um português, e a visceral oposição de lideranças partidárias portuguesas, como o CHEGA e a IL, a tal nomeação.

    É certo, essa hipótese não ter recolhido o entusiasmo de outros quando aventada, durante a última campanha eleitoral, e é engraçado ver agora quem encabeçou a lista da AD ao Parlamento Europeu, dizer agora ser favorável, á hipótese de nomeação, quando em campanha, afirmou, ao ser especificamente questionado, sobre o tema, “António Costa é passado”. Até os miúdos mudam de opinião.

    Percebe-se a urticária de André Ventura, relativamente a António Costa, afinal este conseguiu levantar uma espécie de cerca sanitária à volta do CHEGA, de tal forma que hoje o CHEGA só não faz parte da solução de governo, para desespero de Montenegro, dada a conotação com a extrema-direita.

    Por seu lado Cotrim Figueiredo, sem conseguir explicar porque acha paroquial o governo de Portugal apoiar um português para um dos mais importantes cargos europeus, questiona as vantagens de se ter um português num tal cargo, neste termos: “o que ganhamos com isso?”

    Espantosamente vimos, também, mais ou menos na mesma linha, o líder do PCP, estabelecer um paralelismo com a passagem de Durão Barroso pela chefia da Comissão Europeia, sem que Portugal, na sua opinião, tivesse retirado, daí, qualquer benefício.

    Este tipo de argumentário já o vi por aí, relativamente a António Guterres, o actual Secretário-Geral da ONU, e antes desse cargo, também sobre o seu anterior alto cargo na ONU para os refugiados.

    O argumento do “ganho” em se ter um português num cargo internacional, como de Presidente do Conselho Europeu, se tal fosse possível comensurar, falece, perante o seu contrário, ou seja, que ganho, para Portugal, existira, se um não português for nomeado Presidente do Conselho Europeu?

    O argumento da preparação, do perfil, da competência, de António Costa,  no confronto com outras personalidades, não colhe, em seu desabono, pois todos lhe reconhecem essas qualidades, não só em Portugal, mas sobretudo na Europa, onde granjeou um prestigio assinalável, por mérito próprio, e não por demérito alheio.

    Os eventuais “ganhos” por vezes são incomensuráveis. Qual o “valor” de se ser português? Pode ser representado em número, pecuniariamente? Em dólares ou euros?

    Em 2006, assisti, em Insbruck, Áustria, a um congresso  das autoridades locais europeias, e sentado na plateia, apreciei a alocução do Presidente da comissão Europeia, Durão Barroso, em várias línguas, e não deixei de notar as reacções de surpresa dos circundantes, ao verem um português discursar nas suas línguas, com um manifesto á-vontade, e mesmo com o conteúdo da sua verbe, dado estar em linha com o que viria a ser uma das conclusões do encontro, preconizando a participação activa dos poderes locais no processo legislativo europeu, via Comité das regiões.

    Dou aqui outro exemplo que me foi narrado por um formando meu há muitos anos: este meu formando trabalhava algures numa plataforma petrolífera, no golfo pérsico, e era o responsável pelos aprovisionamentos alimentares da plataforma. Certo dia, entrando o stock em ruptura, recorreram aos préstimos de um xeique qualquer, e este por alguma razão recusava liminarmente satisfazer as necessidades da plataforma, e tudo dependia dele. Deslocou-se ao palácio do dito Xeique, a fim de pessoalmente o sensibilizar para a situação. O Xeique olhando-o nos olhos não mostrou uma pinga de emoção face ao pedido de ajuda, mas, vá-se lá saber porquê, perscrutando a vestimenta do português, engraçou com o pólo que trazia vestido, e o português respondeu-lhe, que era de confecção da sua terra … o Xeique quis saber de onde era … Portugal, sou português, respondeu-lhe. O Xeique arregalou os olhos, e de imediato deu ordens para se fornecer tudo quanto o português necessita-se, e afirmou, qualquer coisa como Vasco da Gama muito importante, Portugal muito importante, por aquelas bandas.

    Isto é de arrepiar. É este o “valor” da Portugalidade. Nunca se sabe quando vai ajudar, e em que condições.

    Camões, bem o sabia, existem também uns parolos, paroquiais, que bem podiam figurar no Portugal dos pequeninos, não naquele de Coimbra, mas naquele outro onde os velhos do restelo pululam como baratas.

    Oliveira Dias, Politólogo

    Publicado no Semanário NoticiasLx:

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