Silly Season no Hospital: Costelas, Cartão Bancário e Cêntimos

Os seguros de saúde já funcionam como um desvio confortável da confusão do setor público. Não se sabe se há vaga, o tempo de espera pode ser longo, mas ao menos há sofás e ar-condicionado. Quem tem seguro anda muito mimado. A Saúde não pode ser um luxo e tem de ser acessível a todos os portugueses, independentemente da sua condição económica. Esperemos que um dia isso aconteça em Portugal.

Silly Season no Hospital

Foi uma manhã como qualquer outra. Ou melhor, como aquelas em que se entra no duche meio a dormir. Um pé escorrega, o mundo gira em câmara lenta e zás… uma valente pancada nas costelas. Um misto de “acordei de vez” com “isto não vai correr bem”.

Passadas umas horas as dores nas costelas começaram a falar mais alto. E, em vez de ligar para Linha SNS24 ou averiguar se a Urgência do Beatriz Ângelo estaria a funcionar, fiz o que muitos portugueses com seguro de saúde fazem: segui direto para um dos hospitais privados de Lisboa.

Os seguros de saúde já funcionam como um desvio confortável da confusão do setor público. Não se sabe se há vaga, o tempo de espera pode ser longo, mas ao menos há sofás e ar-condicionado. Quem tem seguro anda muito mimado. A Saúde não pode ser um luxo e tem de ser acessível a todos os portugueses, independentemente da sua condição económica. Esperemos que um dia isso aconteça em Portugal.

Voltando à minha ida ao Hospital. Após o atendimento na urgência, com radiografias e medicação, dirigi-me ao balcão de pagamento e veio o momento da verdade: €91,05 a pagar.

Entreguei duas notas de €50, à espera de um troco rápido. Mas o jovem funcionário olha para mim com ar esperançoso e pergunta:

– “Tem trocado?”

Olhei para a carteira, vasculhei e só encontrei 1,04€.

– “Vou buscar troco”, responde ele. E desaparece num ápice, por largos minutos.

Mais tarde o jovem funcionário reaparece e inicia a contagem de um número considerável de moedas de 1, 2 e 5 cêntimos:

– “São para mim?”, perguntei.

– “Sim” respondeu.

– “Então fiquem com o troco”, retorqui, já a sentir as dores nas costelas a reagir à emoção e ao peso daquelas moedas.

Mas logo me arrependi e pedi que me devolvesse os €100 iniciais, porque afinal o melhor era pagar com cartão. Só que:

– “Já troquei as notas”, respondeu com a serenidade de quem já viu de tudo atrás do balcão.

Aceitei resignado, desde que as moedas viessem num saquinho apropriado, pedindo simultaneamente o livro de reclamações. Nesse instante, uma outra colega surge e, diligentemente, devolve-me os €100 euros. Paguei com cartão. Tudo certo. Tudo calmo.

Mas o jovem funcionário ainda fez questão de me entregar o livro de reclamações. Já não fazia sentido e não o quis. Então ele sai do balcão, pede desculpa e estende-me a mão para um aperto. Toque final de reconciliação. Fora do balcão eu o jovem funcionário ainda trocamos conversa de circunstância e cada um de nós seguiu a sua vida.

Tudo isto não foi só uma questão de troco. Foi um episódio digno da “silly season” em que: a) dinheiro físico parece uma relíquia do passado; b) jovens funcionários não sabem o que fazer com notas e moedas; c) os clientes sentem que pagar com dinheiro é quase um ato subversivo.

Vivemos tempos em que os pagamentos digitais são a regra, e o uso de notas e moedas parece uma cena saída de um filme de época. A geração mais jovem habituada a pagamentos por aproximação parece desconfortável com o toque real da moeda. A dificuldade em lidar com notas e troco em cash revela que o dinheiro físico se está a tornar alienígena.

Também podemos analisar a situação como um choque cultural entre gerações: para os mais novos trocar notas e moedas parece um grande desafio; para os mais velhos pagar em dinheiro continua a ser o modo natural, não vá haver mais um apagão que impossibilite o uso dos cartões bancários. Pela minha parte não me esqueço que também já fui jovem e, imagino o que os mais velhos da minha época pensavam ao ver-me a falar ao telemóvel enquanto passeava o cão. Modernices.

O episódio podia ter sido simples: pagar com €100 e receber €8,95. Mas transformou-se numa novela leve: troco em moedas, notas trocadas atrás do balcão, livro de reclamações que não foi usado e um pedido de desculpa final com aperto de mão.

Sim, normalmente escrevo com uma lupa crítica. Mas hoje é diferente. Não há partidos, não há slogans. Só uma história real com um toque de nonsense.

E afinal… não tinha costelas partidas.

Era só dor muscular. O drama serviu apenas para lembrar que escorregar no duche é o novo teste de stress aos serviços de saúde e ao troco.

Uma lição: convém sempre perguntar se há troco, ou melhor, pagar logo com cartão. Faz menos drama e faz melhor à saúde mental.

– Fernando Pedroso, Líder da bancada do CHEGA na AMO e Adjunto do Conselho Jurisdição do CHEGA

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Fernando Pedroso
Fernando Pedroso
– Fernando Pedroso, em 2021-2025, Líder de bancada da AMO, em 2025-2029, Vereador do CHEGA na CMO e Adjunto do Conselho Jurisdição Nacional do CHEGA

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